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Blog do PCO

A resistência de quem vai perder privilégios

O decreto de intervenção federal na segurança do Rio de Janeiro dará ao governo Temer um pouco mais de prazo para conseguir os 308 votos necessários, na Câmara, para a aprovação da reforma da Previdência. Criticada, modificada e incompreendida pela maioria dos brasileiros, o ex-ministro da Previdência Social no governo FHC, Roberto Brant (foto), atribui as resistências à reforma apenas aos que recebem altos salários, os que são privilegiados e que se beneficiam com a manutenção das atuais regras. O assunto, no entanto, terá que ser enfrentado pelo próximo presidente, qualquer que seja o eleito, porque o rombo está cada vez maior por conta desses privilégios. Os parlamentares, no entanto, só legislam em causa própria, segundo Brant, pensando apenas na manutenção dos seus próprios mandatos.

 

Vale a pena o preço que o governo está pagando para aprovar a reforma da Previdência com tantas alterações no texto?

Acho que qualquer mudança que for feita compensa. Nós estamos acostumados com a reação do Congresso Nacional a qualquer mudança no sistema de Previdência, porque o Congresso é capturado apenas pelas corporações mais influentes do Brasil. O Congresso fecha os olhos para o conjunto da sociedade. Fecha os olhos sistematicamente para a racionalidade fiscal, mas é zeloso em preservar os privilégios que o próprio Congresso semeou na Constituinte, onde eu estava presente e pude ver, com meus próprios olhos. De sorte, que o governo, nesse caso, não tem força para impor o que é necessário. A maioria dos deputados está pensando exclusivamente na sua própria reeleição, porque para eles, a política é um fim em si mesmo. Um mandato é um fim em si mesmo. Eles estão pouco se lixando com o que fazer com o seu próprio mandato. Resta ao governo ceder, porque não há um caminho alternativo. A opção seria desistir da reforma, o que deveria ser o último recurso. Acho que o governo deveria votar até para perder para mostrar a cara de quem pensa na sociedade e quem pensa só em determinados setores, que ele está lá para proteger. Acho que o Congresso brasileiro não é mais representativo da sociedade. Esses 30 partidos são puras agências financeiras, que vivem apenas para se perpetuar no poder. Nós estamos em um momento difícil. O governo é vítima. Não foi o governo que escolheu esse Congresso, não foi o governo que escolheu essas pessoas. Essas pessoas foram escolhidas pelo povo brasileiro inconscientemente. Nós temos de nos conformar com essa triste realidade.

 

Mas qual será o efeito dessa reforma, depois de tantas mudanças?

Se fosse um real já valeria a pena. Na verdade, o Brasil está capturado pelos interesses das pessoas mais ricas. A Previdência do Brasil é um escândalo. Com isso, a reforma é uma coisa que todo governo tem que fazer uma. Fernando Henrique Cardoso fez, Lula fez, a Dilma não fez nada, mas o Temer está fazendo e os próximos vão ter que fazer. Eu quero ver se na campanha eleitoral, algum candidato vai ter coragem de dizer que não é necessário fazer a reforma da Previdência.

 

Alguns sindicatos estão fazendo uma campanha agressiva contra a reforma da Previdência. Isso também prejudica a discussão do que deve ser mudado?

Mas é claro que fazem. Eles fazem parte da elite do funcionalismo público. Eles ganham R$ 20 mil, R$ 30 mil reais por mês e se aposentam com esse salário, com 50 anos de idade. Eles estão defendendo os interesses dos fiscais. Não é todo fiscal que é assim, mas o sindicato dos fiscais é assim.

 

Por que o governo tem tanta dificuldade em apontar essas distorções?

Ele está expondo. Já expôs, mas não adianta. Os deputados não querem ouvir. Os deputados querem fazer favor para os juízes, promotores, fiscais, a todas as categorias da elite do funcionalismo público. E com isso, o que nós temos hoje: a União está com um déficit imenso, com um endividamento enorme, os estados estão quebrados. A maioria deles não consegue nem pagar os salários em dia. Não conseguem fazer um quilômetro de estrada. Não consegue fazer um posto de saúde. Esse não é o Brasil que nós queremos. É o Brasil que o Congresso brasileiro está nos obrigando a conviver com ele.

 

Isso quer dizer que os congressistas trabalham contra o Brasil?

Eles trabalham para si mesmos. Eles trabalham exclusivamente para se reeleger. Eles não têm nenhuma outra preocupação. Para a maioria da população esse é um assunto complexo. Falar de explosão demográfica, de projeções, de gastos do estado é muito difícil. Para o homem comum, que passa a maior parte da sua vida tentando sustentar a si próprio e à sua família, é difícil ficar lendo matéria a respeito do assunto para formar uma opinião sobre isso. Geralmente, as pessoas mais demagogas, mais irresponsáveis falam mais alto e dizem que essa reforma é para prejudicar os pobres. Mentira! Essa reforma é para atingir os privilégios inaceitáveis dos ricos. Uma pessoa comum, um comerciante, um trabalhador da construção civil, um taxista vai pegar o projeto da reforma Previdenciária para examinar, para analisar o envelhecimento da população, como os outros países tratam da Previdência? Não se pode pedir isso para essas pessoas, não é razoável. Não são só os brasileiros, são os americanos, os franceses, os ingleses. Cabe à classe política enfrentar a impopularidade e fazer a reforma, porque sabe que ela é benéfica para o conjunto da população. Nós saímos de três anos de recessão, de desemprego, com juros altos, inflação. Tudo isso está começando a ser consertado. Se não passar a reforma da Previdência, o inferno vai começar de novo em 2019, qualquer que seja o escolhido.

 

Não há alternativa. Se a reforma não for aprovada agora, o próximo presidente terá que fazê-la?

 Com a Lei de Responsabilidade Fiscal e com a emenda do teto, ele vai ficar sujeito a impeachment, porque ele não vai poder cumprir nenhum dos dois. Esses governadores que vão sair agora, sem nenhuma culpa deles, porque eles herdaram uma situação que foi construída ao longo do tempo, eles vão enfrentar graves problemas na Justiça, porque não estão cumprindo a Lei de Responsabilidade Fiscal, por culpa das leis e da Constituição. Eles estão tirando dinheiro da saúde, da educação para pagar salário. Tudo isso é irregular. Eles vão sair do governo e vão ter que contratar uma banca de advogados para defendê-los. É uma situação surreal. Uma pessoa racional e prudente, não tem coragem de assumir o governo, nem de graça. Tem gente que ainda quer ser governador de Minas. Para que? Para atrasar salário de policial e de professores, sem fazer mais absolutamente nada? Metade de todos os gastos do governo federal são para pagamento de benefícios previdenciários. A receita total da União é de R$ 1,300 trilhão. Esse ano a União gastou R$ 700 bilhões para pagar o benefício previdenciário e gastou R$ 120 bilhões com a saúde. Pode isso? Vai chegar um momento crítico, não sei quando, mas não está longe, em que o governo, as presidências da Câmara, do Senado e o Supremo Tribunal Federal, vão se reunir e fazer um ato tirando 30% de todas as aposentadorias, porque senão, não será possível pagar.

 

Tem muito discurso populista nessa reforma. Se o senhor fosse presidente da República, convidaria o deputado Paulo Paim para ser o ministro da Previdência?

Eu procuraria prendê-lo ou exilá-lo, nomeá-lo embaixador no lugar mais distante do mundo para ele ficar longe do Brasil. Nós não podemos fazer uma experiência com um país como o Brasil. O Brasil é um país importante, com mais de 200 milhões de habitantes, fabrica aviões, navios, equipamentos. O Brasil é um país sofisticado, tem cidades com São Paulo, como Belo Horizonte, Rio de Janeiro. Nós não podemos fazer experiências. A Dilma foi fazer e olha o que aconteceu? O Lula, justiça seja feita, nunca quis fazer essa experiência. Ele ficava longe do Paim, que era um inimigo dele. Na reforma da Previdência, quando fui presidente da Comissão, o Paim vivia atacando o governo e votou contra, contrariando a ordem do partido.

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