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Riscos de uma reação maior da população

Paulo César de Oliveira
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O brasileiro se acostumou a acompanhar o noticiário, neste momento em que as crises política e econômica fazem com que o salário encolha, o desemprego aumente e a insegurança passe a ser uma constante no dia a dia. Além disso, passou a protestar e a ter entre seus ídolos figuras do Judiciário. Primeiro o ministro do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa e, agora, o juiz federal Sérgio Moro. Para o cientista político e professor da UFMG, Willian Ricardo de Sá (foto), esse comportamento vem do acesso mais fácil à informação e do interesse popular pelo que vem acontecendo no país.

 

O que leva as pessoas às ruas para protestar?

Tem pessoas agindo de jeito variado. Quem está agindo politicamente contra, certamente está indignado, se sentindo lesado e está enfrentando uma conjuntura econômica muito difícil, que foi, em larguíssima medida, propiciada pelo próprio governo, quando cometeu uma barbeiragem na política econômica no primeiro governo Dilma, e está se sentindo lesado pela revelação dessa trama toda milionária, de favorecimento e desvios de recursos.

 

O povo brasileiro sempre foi visto como sendo muito pacífico. Mudou essa visão ou o brasileiro é que mudou?

Acho que isso se deve um pouco ao acesso à informação. Tem havido uma circulação razoável de informações a respeito do assunto (Lava Jato). A imprensa tem feito uma cobertura variada, uma hora melhor, outra pior, mas satisfatória, do que está acontecendo. Tem-se muito acesso à internet e circula muita informação. Em boa medida, isso tem a ver com a facilidade de informação das pessoas em uma conjuntura ruim. As pessoas associam os problemas, em grande parte, ao desgoverno e daí vem a reação, até agora, muito comedida. Não passamos nem perto de coisas comuns em outros países, por coisas muito menores. Por aqui as coisas ainda estão muito comedidas, tranquilas. Tem pessoas que levam crianças em carrinhos, em um ambiente muito tranquilo.

 

O nível de tensão pode aumentar?

Pode, mas isto é apenas uma hipótese, pelo seguinte: se o processo de decisão normal funcionar, a situação tende a ficar como está. O grande problema é se continuarem surgindo informações novas, que podem vir das delações premiadas, que devem abrir frentes para novas investigações de casos semelhantes ao da Petrobras, no setor elétrico, de forma que essa investigação não termine. Se for para os financiamentos internacionais do BNDES vai entrar um nível de informação negativa para o governo muito grande, de novo. Tem um fluxo contínuo de motivação para a ação de oposição. Se essas denúncias estiverem sendo processadas pela Justiça, pelo Parlamento, o que não quer dizer votar favoravelmente ao impeachment, mas com outras ações. Se a Justiça também esclarecer as ocorrências, processar os suspeitos e continuar com os processos, aí eu acho que as coisas permanecem civilizadas, como tem estado. Se não, isso pode provocar uma frustração muito grande e o resultado, não arriscaria a dizer qual é, mas não afasto a hipótese de uma exacerbação de comportamento por parte de setores da sociedade contrariada.

 

A divulgação dos grampos do ex-presidente Lula, inclusive com a presidente Dilma, parece ter deixado os ânimos mais acirrados de um lado e de outro.

Eu acho que antecede um pouco esse fato. No depoimento do Lula, a reação dele foi para provocar isso. Ele foi muito agressivo com os que ele julga que o estejam perseguindo e aí acontece uma coisa inversa. A imprensa, a OAB, a Justiça, a oposição… e aí tem um problema policial para ser resolvido, um problema jurídico. Ele transformou isso em uma grande perseguição e ele atingiu a muitos com isso. Ao mesmo tempo, se dirigiu à militância do partido dele, pedindo que as pessoas fossem para as ruas e arreganhassem os dentes. Não tendo assumido a Casa Civil, ele trouxe um aquecimento adicional à política, com uma atitude de confrontação, de desafio, bater de frente e tem sido a atitude dele desde então.

 

Para ele, Lula, de certa forma foi decepcionante a forma como a população reagiu?

Eu imagino que sim. Vendo a transcrição do telefonema dele com o senador Jorge Viana, parece até uma estratégia pensada. O que Jorge Viana propõe para ele? “Politize a sua relação com a Justiça. Desobedeça as determinações do juiz. Se chamar para depor, não vá”, ou seja, transformar isso em um grande problema político. Aparentemente ele continua jogando nessa linha. Da mesma forma que seguiu o conselho do cientista político, o Alberto Carlos Almeida, que está gravado e que teria proposto a ele a assumir o ministério para ganhar espaço político e foro especial. Então, não sei se ele está decepcionado. Tudo faz parte, um pouco, da estratégia dele, que é uma estratégia limite, porque há uma evidência muito forte contra ele, escandalosa mesmo, de comportamento indevido, não republicano. É uma posição desesperada e que está tirando o que tem. Aparentemente o que ele tem é isso. É tentar um clima de confrontação tentar jogar o andamento da Justiça na vala comum de uma estratégia de oposição. A Justiça, inclusive, está processando gente de outros partidos. Inclusive, deve abrir um processo contra o presidente do maior partido de oposição. Mas isso não importa, para esse tipo de debate esse é um elemento descartável. Ele começa a contar a sua versão das coisas para ver se cola.

 

A população vem acompanhando esses processos no Supremo Tribunal Federal desde o mensalão Isso ajuda o cidadão a ficar mais esclarecido em relação ao que está acontecendo?

Eu acho que está mais fácil ter informação qualificada sobre os diversos aspectos da vida pública do Brasil de uns anos para cá, como um ganho talvez não pretendido, deste conjunto de denúncias. Vai ter um processo de impeachment e, sem saber qual vai ser o resultado dele, nós já passamos pela experiência do Collor. Tem um rito, do que é importante nesse rito é que não é golpe, que isso é previsto na Constituição. As informações picadinhas na internet cumprem um papel muito importante para esse tipo de debate, porque todo mundo tem acesso a tudo, desde que tenha um mínimo de interesse.

 

E hoje se tem todo tipo de informação, não existe filtro, não é?

Exatamente, até porque a maior garantia disso é você ter uma imprensa onde os grandes veículos de imprensa são bastante independentes e fazem jornalismo de qualidade. Os grandes jornais, os diários de maior qualidade na televisão, cumprem relativamente bem esse papel de dar essa diversidade de visões, de interpretações. Se a pessoa tiver interesse, ela consegue se informar.

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