O combate à corrupção tem sido prioridade número de vários órgãos e não é diferente com o Ministério Público de Minas Gerais. Mesmo com o orçamento reduzido, devido as dificuldades financeiras do Estado, o procurador-geral de Justiça de Minas, Antônio Sérgio Tonet, disse que tem investido na tecnologia da informação e no cruzamento de dados com outras instituições. Apesar dos problemas enfrentados com os extremos e com o imediatismo da sociedade, os avanços são grandes e significativos.
O ano de 2019 foi de extremos. Isso se refletiu no Ministério Público?
Muito. Foi um ano muito difícil, com muito trabalho, mas os desafios são proporcionais ao nosso entusiasmo e nosso compromisso com o nosso trabalho e com a sociedade. O Ministério Público tem que zelar e defender as políticas públicas, zelar pela segurança pública, pela saúde, defender o patrimônio público, combater a corrupção e nós, procuradores e promotores de Justiça, estamos imbuídos desse compromisso de continuar trabalhando firmes. Foi um ano difícil, a situação econômica do Estado é preocupante e isso reflete também nos investimentos do Ministério Público. A tragédia de Brumadinho impactou muito o nosso trabalho. Mas temos convicção de que vamos continuar trabalhando para dar o nosso melhor.
Por que as coisas no país não andam em termos de punição?
Na realidade, a sociedade está mudando muito. Nós, com a informação digital, a cada segundo, estamos bastante ansiosos. A sociedade ficou ansiosa, clamando por respostas praticamente digitais. É um tempo quântico. Na Justiça as coisas não andam dessa forma. Há uma sensação de que as coisas não estão andando. Mas se fizermos um corte da Constituição de 1988 para cá, muitas coisas que não aconteciam em matéria de punição começaram a acontecer. Lá atrás, a Justiça começou a punir e o próprio poder político começou a se depurar com a CPI dos Anões, no Congresso Nacional e isso foi um avanço. Depois vieram tantas outras operações como a Lava Jato, que é a última, e estamos trabalhando bastante. Nós comemoramos o combate à corrupção, formando uma rede composta por diversas instituições para manter viva essa necessidade de combater a corrupção no Brasil. O país foi catalogado na ONU como o segundo que possui a maior concentração de rendas do planeta. Isso significa que aqui, os ricos são mais ricos e pobres são cada vez mais pobres. Nós precisamos, com a consciência, com a imprensa cobrando e as instituições trabalhando, melhorar essa situação.
Em que nível existe mais corrupção: no município, no estado ou no governo federal?
É difícil dizer. Nós temos cerca de 40 mil ações tramitando no Brasil, envolvendo atos de improbidade administrativa, corrupção, envolvendo prefeitos, vereadores, deputados. Em termos numéricos essas ações atingem mais os municípios, vereadores e prefeitos.
São quantas ações em Minas?
Não tenho essa estatística, mas Minas Gerais possui 853 municípios, milhares de vereadores, tem danos a secretarias de Estado, então nosso trabalho é muito grande.
O senhor estava falando em cortes no orçamento, houve corte no orçamento do Ministério Público?
Nós estamos tendo cortes sistemáticos. Em primeiro lugar, aqueles decorrentes da lei Complementar 156. O Estado de Minas Gerais tem aderido a projetos de renegociação da dívida com a União e nessas negociações ele tem que cumprir algumas metas. O Ministério Público vem cumprindo metas e contingenciando desde 2017. No ano passado contingenciamos cerca de R$ 45 milhões e nesse ano poderemos chegar a R$ 50 milhões de contingenciamento. Um dinheiro que não será gasto, que será economizado em decorrência dessa lei.
O combate à corrupção parece ser a grande preocupação nacional. Aumentamos a corrupção ou estamos apurando mais?
Acredito que estamos apurando mais. A corrupção sempre existiu, não é obra do presente, é algo que está arraigado, é um cancro, uma chaga cancerosa que se abate sobre nosso país. Aliás, esse é um fenômeno mundial, universal. Só que você tem países como a Finlândia, que detém o menor índice de corrupção do planeta e países como o Brasil e tantos outros onde a educação ainda não está bem apurada nesse aspecto.
Tanta burocracia postergando apurações e punições. Não era hora de rever isso?
A legislação é bastante generosa com os órgãos reguladores, com o Ministério Público, as polícias, as controladorias gerais do estado, da União. O problema não está na legislação, está na apuração, que é difícil mesmo. Ninguém pratica corrupção à luz do dia. As provas, muitas vezes, são indiciárias, e dependem muito da tecnologia da informação. Aqui no Ministério Público, estamos investindo muito em tecnologia da informação, em novas ferramentas para apuração de danos. O Ministério Público de Minas já foi catalogado pelo Conselho Nacional do Ministério Público como o último do país em investimentos em tecnologia da informação. Hoje, após três anos, com os investimentos que estamos fazendo, nós já estamos em um patamar bem elevado e criamos ferramentas digitais para combater a corrupção e, com isso, vamos avançar.
Mas os senhores acompanham o nível de tecnologia dos corruptos?
Não, mas estamos chegando perto. Estamos cruzando dados, juntando em um banco único todos os dados do Estado, da Polícia Militar, do Ministério Público, da Polícia Civil, do Tribunal de Contas. Com a tecnologia, com essas novas ferramentas nós vamos poder cruzar milhões de dados em segundos, estabelecer vínculos entre criminosos, políticos, empresários para que possamos ter um combate mais direcionado. O que acontece muito hoje é que a Justiça trabalha com milhares de casos. Às vezes, pequenos casos que seguram muito nosso trabalho em um grande caso. Nós, às vezes não temos tempo e condições materiais e humanas para dar conta de todos os itens, todos os trabalhos, todos os ilícitos. Nós precisamos também ter a coragem de priorizar mais.
Nos cursos de Direito ensinam que Justiça que tarda é Justiça que não existe.
A Justiça tardia não é Justiça. É injustiça manifesta e qualificada, como diria o jurista italiano Calamandrei. Nós temos que dar eficiência.
Nós estamos longe disso?
Nós estamos longe, mas estamos dando passos largos. As instituições como o Tribunal de Contas da União, o Tribunal de Contas dos Estados, os Ministérios Públicos, as Controladorias têm trabalhado mais em rede. Nós estamos procurando afastar o protagonismo, a arrogância institucional de querer achar que a minha jurisdição é a melhor e a mais qualificada e a única capaz de combater a corrupção para defender a sociedade. Temos todas as instituições e nós estamos encontrando, principalmente em Minas Gerais, um espaço de diálogo e rede muito forte para combater a corrupção e defender as políticas públicas.