Devagar, o país vai encontrando o seu rumo. O resultado do PIB do segundo trimestre trouxe esperança para o setor produtivo e movimentou o setor de serviços. As contratações voltaram, o desemprego diminuiu e, por outro lado, muitos decidiram buscar abrir o seu próprio negócio. O diretor superintendente do Sebrae, Afonso Rocha (foto), disse que esse movimento foi detectado nos últimos três anos, principalmente entre os mais jovens.
O crescimento do PIB em 1,2% no segundo trimestre teve uma forte influência do consumo e do setor de serviços. O Sebrae percebe essa mudança no mercado?
Sim, percebemos, inclusive uma preocupação com a questão da infraestrutura. A sensação que nos dá é que ficou uma demanda bastante reprimida durante esse período da pandemia e, agora, as coisas começaram de fato a funcionar. Nós estamos então vendo, por exemplo, o índice de desemprego reduzindo. Esse crescimento do PIB de 1.2% reforça um pouco essa questão e o setor de serviço acaba sendo extremamente afetado em um aspecto positivo. Na verdade, na economia nunca podemos falar sobre um aspecto de um setor em especial. Nós temos, não que imaginar que a infraestrutura está sofrendo porque a indústria está produzindo, o comércio começa a reagir de forma também positiva e, consequentemente, o último elo dessa cadeia é o setor de serviços. Percebemos isso no movimento dos aeroportos, movimento da cidade, existe aí uma perspectiva, que o próprio Sebrae vem observando, que é uma melhoria no humor dos pequenos negócios, que começam a perceber que a economia vem reagindo.
Isso significa também que pode ter pane de energia, pane no setor de transporte devido a falta de infraestrutura?
Não tenha dúvida, porque quando falamos do problema da infraestrutura é que percebemos o problema. Conversei recentemente, por exemplo, com um fabricante de armários planejados e ele falou da dificuldade que está tendo de receber o MDF. Falta MDF no mercado. Percebemos que o setor de embalagem começa também ter um sufoco para fazer as suas entregas e quando percebemos uma recuperação da economia, embalagem é um dos setores sensíveis. Em grande escala, mundialmente já vemos falar de estrangulamento de portos. Existe, de fato, uma preocupação com a infraestrutura e, aí vem, obviamente energia e transporte. Tivemos um pequeno alento, um respiro, com a redução do preço dos combustíveis. Isso, de fato, é um fator fundamental, como um aspecto nervoso no impacto no desenvolvimento econômico e é algo que, realmente é fundamental.
O país precisa crescer, mas não está preparado para isso?
Nós podemos perceber nos próprios projetos dos candidatos presidenciáveis essa preocupação. Eles têm falado na questão de atacar a infraestrutura logística. Falam em melhoria das nossas rodovias, que ainda são bastante precárias. Se compararmos com outros países, a qualidade das nossas rodovias hoje, principalmente considerando que o Brasil é um país que é muito dependente do transporte rodoviário, temos muito o que fazer. Muitos (candidatos) têm nos planos de governo o de fazer mais ferrovias, cortar o país de ferrovias, o que acaba sendo um transporte extremamente mais barato. No país, onde uma das suas fontes de desenvolvimento é o agronegócio, é um sonho ver a produção agrícola do Brasil sendo escoada pelas ferrovias, porque o custo de transporte de grãos para os portos acaba sendo algo muito oneroso, pelo fato de que ainda não temos uma infraestrutura ferroviária adequada para fazer esse tipo de escoamento.
Na última pesquisa de emprego do IBGE foi constatado que muitos desistiram de procurar emprego e abriram o próprio negócio. Como o Sebrae atua para ajudar essas empresas a não fecharem as portas?
Essa é uma situação que a gente já vem observando de uns 3 anos para cá. O que está acontecendo é que em 2008 foi criada a figura do empreendedor individual, inclusive uma comissão do Congresso Nacional aprovou a ampliação do limite de faturamento de empreendedores individuais de R$ 81 mil ao ano para R$ 144 mil ao ano. Esse aumento vai propiciar um aumento desse número de pessoas que desistem de procurar emprego e aí entra uma bandeira muito forte, que nós do Sebrae temos falado muito, porque essa nova geração que está surgindo está percebendo que se eles se dedicarem um pouco mais para o processo da educação empreendedora, a formação gerencial e o conhecimento do ato de ser gestor e, principalmente, ser gestor de pequenos negócios, eles vão poder ter uma alternativa de sustentação das suas vidas, que não apenas aquela de pegar uma carteira de trabalho e bater na porta das empresas para pedir emprego. Nós temos no Brasil um outro aspecto que facilita isso, porque desde que o STF julgou a questão da terceirização. Fico com uma frase que eu ouvia um tempo atrás de uma economista em Brasília dizendo o seguinte: o futuro do emprego no Brasil passa pelo empreendedor individual. Isso é uma tendência e é um caminho sem volta. Nós vamos ter muitas pessoas trabalhando nas empresas, mas na condição de prestador de serviço, na condição de terceirizado, porque o empreendedor individual hoje custa mais barato para a empresa pois, enquanto prestador de serviço, ele tem nota fiscal, ele tem cobertura da Previdência e é muito mais barato para a empresa hoje contratar determinados serviços via terceirização do que é contratado para o quadro como funcionário. Mesmo que algumas correntes políticas aí que pregam o amplo emprego, nós do Sebrae observamos um mercado muito mais pela linha da oportunidade, do que necessariamente de emprego, porque o que nós temos que esforçar sempre é para ter pessoas qualificadas, ter pessoas preparadas para aproveitar a oportunidade e não necessariamente que seja uma pessoa que vai ficar eternamente dependente de conseguir um emprego.
A pandemia e a guerra anteciparam o futuro dos negócios no país?
Não tenha dúvida Antes da pandemia, nós tínhamos pesquisas que mostravam que somente 35% das empresas, principalmente do setor de varejo, utilizavam o comércio eletrônico, as redes sociais. Hoje tem pesquisas que mostram que mais de 70% das empresas já lançam mão desse instrumento. Isso foi uma transformação muito rápida. Nós tivemos que adaptar o Sebrae em cerca de um mês para trabalhar num modelo que em condições normais eu ia demorar 6 meses para me adaptar. A vida das empresas mudou e essa questão da guerra também veio trazer o mercado para uma situação de reflexão, de pensar antes. Falávamos tanto de globalização e hoje precisamos pensar um pouquinho também nos mercados locais, pensar nas potencialidades locais, porque o mundo ainda tem muita fragilidade. (Foto reprodução internet)