Wagner Gomes
A modernidade legou ao homem não apenas progresso material, mas também uma epidemia silenciosa: a da saúde mental. Depressão, ansiedade, solidão, vício em álcool, drogas ou a tela do celular tornaram-se parte do cotidiano. Somos a clientela perfeita para todas as especialidades médicas, a começar pela psiquiatria. Criativos, sim, mas também mestres em fabricar angústias. Esse quadro não é apenas individual: tem reflexos políticos profundos. Parte significativa do eleitorado de Lula e de Jair Bolsonaro não se move por ideologia clássica — direita ou esquerda, conservadorismo ou progressismo, ou, pior, pelo que imaginam representar essas ideias — mas por afetos desordenados, medos difusos, sensação de desamparo. O voto, esse ansiolítico barato, torna-se catarse, busca de acolhimento ou de revanche, mais ligado à saúde emocional do que a projetos consistentes de país. Para Lula, há a camada que projeta nele a figura paterna que cuida, o líder que devolve autoestima, mesmo que às custas de promessas irrealistas. Para Bolsonaro, aflora a representação da autoridade que impõe ordem num mundo percebido como caótico, ainda que à custa da intolerância. Ambos captam um mesmo mal-estar civilizatório: a necessidade de entregar a líderes o peso insuportável das frustrações pessoais. A política, nesse sentido, transforma-se em terapia coletiva malconduzida. O comício adquire status de consultório para substituir a sessão de análise; o líder ocupa o lugar de um superego inflado ou de um pai idealizado. A polarização, mais que disputa ideológica, é a exteriorização de uma epidemia psíquica. A sociedade exausta busca no voto não o projeto de nação, mas um analgésico de automedicação para dores íntimas, cujos efeitos colaterais tornam-se devastadores. No meio da fragilidade emocional a esperança política tem consequências graves. Troca-se reflexão crítica por satisfação imediata. A democracia vira arena de catarse, não de deliberação. O risco é claro: transformar eleições em sucedâneo de terapia barata, condenando o país a repetir ciclos de frustração. Reconhecer o fator psíquico por trás da adesão a Lula ou Bolsonaro não significa desqualificar seus eleitores, mas entender que, sem saúde mental coletiva, nenhuma democracia resiste. A política pode aliviar angústias, mas o eleitor não deve ser refém dela. (Foto/reprodução internet)
Wagner Gomes- Articulista













