A ministra Cármen Lúcia assume hoje a presidência do Supremo Tribunal Federal. A mineira, de 62 anos, tem hábitos simples e ficou famosa por suas frases de efeito como “cala boca já morreu”, ao se manifestar em relação às biografias não autorizadas. Outra posição da ministra ao validar a prisão do senador Delcídio Amaral também causou impacto. Cármen Lúcia usou palavras e expressões comuns aos políticos para se posicionar em relação ao assunto. “Na história recente da nossa pátria, houve um momento em que a maioria de nós, brasileiros, acreditou no mote segundo o qual uma esperança tinha vencido o medo. Depois, nos deparamos com a Ação Penal 470 e descobrimos que o cinismo tinha vencido aquela esperança. Agora parece se constatar que o escárnio venceu o cinismo. O crime não vencerá a Justiça”.
Sem festas
A posse de Cármen Lúcia está marcada para esta segunda-feira, às 15h. Não haverá festa, a ministra decidiu que o momento de crise política e econômica do país, não comporta uma recepção. Tradicionalmente a recepção é oferecida pelas associações de classe da magistratura. Cármen Lúcia e o ministro Dias Toffoli, que assume a vice-presidência do STF, devem receber os cumprimentos no Salão Branco, espaço no próprio Supremo. Esta deve ser a marca de Cármen Lúcia: a da austeridade. Agora é aguardado um posicionamento dela em relação ao reajuste dos salários dos ministros do STF, que se aprovado, terá efeito cascata no Executivo, Legislativo e Judiciário, no momento em que o país passa por uma de suas piores crises política e econômica.
Lava Jato
Ao assumir a presidência do STF, Cármen Lúcia deixará a 2ª Turma e a maioria dos processos da Operação Lava-Jato. Ela será substituída na turma por Ricardo Lewandowski. No plenário do Supremo, restarão apenas os processos contra o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), para ela analisar na maior operação de combate à corrupção do país.
Ministra dá o tom de preocupação social na primeira semana na presidência
A nova presidente do STF escolheu pessoalmente a pauta de sua primeira semana no cargo, dando prioridade a direitos trabalhistas e sociais. Nas sessões de quarta e quinta-feira, quando o plenário se reunirá pela primeira vez sob seu comando, foram pautadas 9 ações ligadas ao direito do trabalho, para quarta, e outras 7 relacionadas à saúde, educação e família, para quinta. Quase sempre, nem todas as ações pautadas são julgadas no dia marcado e ficam para uma data futura. A seleção feita por Cármen Lúcia para o início de sua gestão, porém, já sinaliza os assuntos de preferência da ministra.
A primeira sessão será de causas trabalhistas
A primeira ação da pauta de quarta-feira é de autoria da Confederação Nacional dos Trabalhadores da Agricultura (Contag) e busca derrubar decreto de 1996 do ex-presidente que permitiu a um empregador dispensar um funcionário de forma injustificada. O decreto extinguiu uma norma de 1982 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) que havia sido incorporada à legislação brasileira pelo Congresso em 1992. Cinco dos 11 ministros da Corte já votaram e o julgamento será retomado agora com o voto de Teori Zavaski. A segunda ação pautada discute se permanece válida uma regra da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), de 1943, que dá às mulheres 15 minutos de descanso antes de iniciar as horas extras na jornada de trabalho. A empresa autora da ação alega que a norma contraria a igualdade entre homens e mulheres determinada pela Constituição. O STF já havia considerado a norma constitucional no fim de 2014, mas o julgamento foi anulado e agora será refeito. Na terceira ação pautada para quarta, o STF deve decidir se um órgão público também responde por encargos trabalhistas devidos por uma prestadora de serviço que contratou. Há ainda outras três ações com o mesmo assunto a serem analisadas. Outra ação de quarta discute se é válida a jornada de 12 horas para bombeiros civis, seguidas por 36 horas de descanso, num total de 36 horas semanais. Há ainda outras duas ações que discutem se cabe à Justiça Comum ou à Justiça do Trabalho analisar reclamação de servidor municipal cuja prefeitura não recolheu FGTS durante seu vínculo de trabalho.
Ações sociais
A primeira ação da pauta de quinta, de autoria da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), contesta valores anuais repassados pelo governo federal aos estados por meio do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e da Valorização do Magistério (Fundef).Na segunda ação do dia, o governo do Rio Grande do Norte questiona lei aprovada pela Assembleia Legislativa que instituiu plantão, nos fins de semana, para atendimento jurídico à população carente prestado por estudantes de direito da Universidade Estatual. O governo diz que a norma ampliou o gasto sem indicar a fonte dos recursos para manter o serviço. A maior parte das ações previstas para quinta estão ligadas ao direito à saúde. Na primeira delas, o STF deve decidir se é dever do Estado fornecer medicamento de alto custo a portador de doença grave que não possui condições financeiras para comprá-lo. O caso envolve paciente que reivindica um remédio de alto custo para hipertensão pulmonar, mas que não está previsto na relação fornecida pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Numa outra ação semelhante, o plenário analisa se o governo de Minas Gerais é obrigado a fornecer medicamento não registrado na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). O paciente diz não ter condições financeiras de importá-lo, mas reivindica seu direito à saúde. Sobre o mesmo assunto, os ministros poderão analisar uma ação do governo federal que questiona entendimento do próprio STF segundo o qual União, estados e municípios têm responsabilidade solidária no fornecimento de medicamentos e tratamento de saúde. Por fim, existem duas ações também pautadas que discutem se a paternidade socioafetiva prevalece sobre a paternidade biológica.