“Não basta que a mulher de César seja honrada, é preciso que sequer seja suspeita”. A frase é atribuída ao próprio César, Imperador de Roma, como explicação por qual razão se separara de Pompéia, sua mulher, se ele mesmo não acreditava que ela o traíra, como especulavam na Corte. O povo cuidou de criar o provérbio ‘À mulher de César não basta ser honesta, deve parecer honesta’, quando se cobra de alguém uma postura de seriedade no trato da coisa pública. Talvez seja a hora de cobrar dos membros do nosso Judiciário este comportamento. Nenhum outro Poder precisa tanto de credibilidade para fazer valer suas decisões quanto ele que, fora o uso da força, é a instância final para a garantia de direitos. E esta credibilidade vai, aos poucos, descendo pelo ralo, levando junto (ou será puxada?) o Ministério Público. A cada dia surge um escândalo envolvendo membros do Ministério Público, desembargadores, magistrados, membros dos Tribunais de Contas. Quando não diz respeito a um comportamento pessoal, como espancamento da mulher, ser ‘olheiro’ de corruptos nos órgãos de fiscalização, vender sentenças e tantas outras falcatruas, os escândalos envolvem toda a categoria. As mais comuns delas, os supersalários e o pagamento de benefícios que não são concedidos a nenhum outro servidor e até mesmo a trabalhadores da iniciativa privada. Pelos levantamentos da ONG Contas Abertas, o país gastou, em dois anos, a partir de 2014, quando o STF considerou, por liminar, legal o pagamento, mais de R$ 4,5 bilhões com auxilio moradia para perto de trinta mil magistrados e procuradores do Ministério Público Federal. Não interessa onde esteja o beneficiário, se tem ou não imóvel próprio na cidade onde trabalha, cada um recebe em torno de R$ 4,3 mil mensais, o mesmo percebido pelos ministros do Supremo.O simples fato do valor ser o mesmo para quem atua em Brasília, no Rio de Janeiro ou numa localidade no interior do Pará, evidencia a injustiça do beneficio e seu aspecto de complementação salarial. Não é assim na iniciativa privada e não tem qualquer razão de ser com ‘semideuses’ do Judiciário, mesmo porque também não é assim com os comuns mortais dos outros Poderes. A decisão do Conselho Nacional de Justiça determinando que os Tribunais de Justiça deem publicidade aos valores recebidos por cada um dos juízes, mensalmente, lança uma luz sobre o problema, mas certamente, não impede que algum deles seja beneficiário de um contracheque superior a R$ 500 mil, como o de um juiz do Mato Grosso, que ainda teve a ousadia de dizer “não estar nem aí” para a polêmica, por estar exercendo um direito que adquiriu. Forma de expressar que se encaixa perfeitamente num magistrado que não se envergonha de se apegar ao que pode até ser legal, embora nem isto seja, sem considerar a moralidade. A decisão do CNJ, no máximo, é um ‘passa moleque’ em quem busca fazer fortuna no serviço público, confundindo “privilégio adquirido com direito adquirido, até porque, para ser direito adquirido, primeiro tem quer ser direito”, como diz o médico Frederico Pena. Por fatos assim, pelo total desrespeito às leis e a ética é que vamos assistindo o Poder que seria a esperança de corrigir o país, escorrer para a vala comum.