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Mais rigor contra o crime, mas evitando o estado policial

Paulo César de Oliveira
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As expectativas em relação ao trabalho do futuro Ministro da Justiça do governo Bolsonaro, Sergio Moro, são grandes e os seus desafios são muitos. Além de mexer no vespeiro da corrupção no Brasil, aumentando os tentáculos da operação Lava Jato, ele terá que enfrentar as facções criminosas, o tráfico de drogas, as falhas na legislação brasileira e ainda evitar conflitos e a radicalização, que alguns setores tentam estimular. Um trabalho, que o ex-procurador-geral de Justiça de Minas Gerais, Jarbas Soares Jr(foto), acredita que Moro tenha todas as condições de realizar, ouvindo muito e viajando pelo país para conhecer de perto todos os problemas que precisam ser enfrentados.

 

Sérgio Moro está montando uma equipe afinada?

O que notei é que o ministro Sérgio Moro está montando uma equipe de servidores públicos qualificados, muito deles da Polícia Federal, já que ele não pode trazer juízes para a equipe dele, nem Procuradores da República e Promotores de Justiça. O foco da Segurança Pública é no combate ao crime. Obviamente, ele terá que alargar o seu espectro de atuação, porque a pasta é mais complexa do que isto. Certamente ele deve estar convidando os melhores quadros para isto.

 

O senhor acredita que ele vai ampliar o trabalho desenvolvido na Lava Jato?

O ministro teria aceitado o convite por vários motivos e um deles seria para que não acontecesse no Brasil o que aconteceu na Itália: que viesse uma legislação posterior para enfraquecer a investigação e, nesse caso, isso é positivo. Ele, no ministério, também será um braço de apoio à própria Lava Jato, porque ele está levando o Coaf para lá e a Polícia Federal já é, então, e isto é importante para a investigação. Ele tem o compromisso moral com essa causa, porque ele foi o juiz da Lava Jato e tem um quadro de funcionários, a princípio, técnico. Ele tem que aprofundar nisso, fazer alianças internacionais para combater o crime organizado, não só o crime de colarinho branco, mas os demais crimes, inclusive das organizações criminosas que agem no Brasil, com ramificações fora. Essa é só uma parte do Ministério, ainda tem outros, como o sistema prisional, tem o aperfeiçoamento da legislação, é um mundo de coisas. Sempre defendi que hoje, o Ministério da Justiça precisa de pessoas joviais, não em questão de idade, mas com um ânimo muito grande, com pique para exercer o Ministério. Não dá mais para sentar na cadeira e dizer “sou o ministro da Justiça” e ficar tratando de assunto do Poder Judiciário e de governo, só. Não. O ministro tem que ter pique para um dia acordar no Rio Grande do Norte para enfrentar a questão dos presídios, no outro dia estar na fronteira no Mato Grosso do Sul, no outro dia estar sentado em Curitiba, levando mais apoio à Lava Jato. Enfim, que não seja um burocrata nem uma pessoa sem pique, como foram talvez as figuras de outras épocas no Ministério. Justiça e Segurança Pública que envolve muitas coisas. Tem o sistema prisional, o sistema antidrogas, e é preciso muita força e juventude.

 

Com essa legislação que nós temos aí é possível combater o crime?

Tem dado muitos resultados. A legislação não é ruim, e para o crime organizado, a lei de organizações criminosas é muito importante. Mas o ministro terá que reformular a legislação. Ele terá que passar por alguns constrangimentos, porque ele não é mais um juiz, ele terá que ir ao Congresso Nacional trabalhar e dialogar com atores importantes. Ele está com a autoridade moral muito grande vinda da população. A causa dele é boa, mas temos que ter um cuidado também e aí vale muito o papel do Ministério Público, da Procuradoria-Geral da República e do próprio Supremo Tribunal Federal. Acho que o ministro Moro tem capacidade jurídica suficiente e discernimento pelas declarações que eu tenho ouvido dele, para o Brasil não extrapolar e ferir direitos constitucionalmente garantidos, ou que estejam na ordem jurídica mundial, nos tratados internacionais e nas cartas que o Brasil aderiu, para não criarmos aqui um direito penal do inimigo. Não pode ser nem todo o céu, nem todo o mar. Temos que ter uma legislação dura, firme de combate ao crime e que não coloque o cidadão em uma situação de risco iminente diário. Nós temos visto algumas decisões de prisão preventiva e cautelares muitas vezes com pouco embasamento nas decisões, sem individualizar condutas. Prendem 20, 50 pessoas e isso é um perigo. No caso do futuro ministro Sergio Moro, com vinte e tantos anos de carreira, que se aperfeiçoou nessas técnicas todas, que fez muitos cursos, certamente, vai ouvir muitas pessoas do meio, como ministros, do Poder Judiciário, gente do Ministério Público estadual, federal, Defensoria Pública, as Polícias Federal e outras. É preciso muito cuidado para que o Brasil não virar um estado policial, não é isso também o que nós queremos.

 

Como quebrar essa sensação de impunidade, que todos nós sentimos, inclusive o Ministério Público?

São várias formas, uma delas é mostrar que no Brasil a lei funciona. Por isso que em vários países as leis são respeitadas, porque elas funcionam. É uma questão cultural também, porque a lei funciona e as pessoas vão começar a colocar os pés para trás. A segunda forma é a sensação de segurança. O Estado não pode estar em todo lugar, então, tem que dar essa sensação de segurança e nós vamos ter que reformular todo o sistema, a parte investigativa e o trabalho grande que terá pela frente, não é só para esse governo e talvez nem para esta geração. É preciso ter não só a sensação de segurança, como de que a lei vai funcionar e que cometer crime não é bom. Eu acredito que o Poder judiciário vai estabelecer, certamente, prioridades, e que nós, que estamos fora da máquina do Poder Judiciário, nós também temos que estabelecer certas prioridades, sem nos esquecermos dos crimes comuns, que são aqueles que afetam diretamente a vida das pessoas. O que o Brasil terá que reformular no seu sistema. A informatização vai ajudar muito. Eu mesmo estou em uma investigação no Paraná, e quem é aqui de Minas fica de queixo caído. Fui lá fazer a investigação e simplesmente não tinha papel. Tudo é informatizado e as audiências são todas gravadas. Isso vai facilitar muito. Nós vamos ter que investir para colher resultados. Esses valores recuperados podem servir para um fundo e tenho a impressão que essas pessoas lá do Ministério, dialogando com as pessoas que tem o conhecimento, vão buscar mecanismos de fortalecer, desde a base na Polícia Civil, na investigação, como crimes maiores do colarinho branco. Como diz o Ministro Barroso, o retrato não é bom, mas o filme é.

  

Nós estamos vendo algumas situações de conflito, principalmente com os Sem Terra. Pode haver um clima de revanchismo?

Aparentemente, tem parte da sociedade que está pregando certo tipo de comportamento. Aí compete ao próprio presidente da República e ao Poder Judiciário, se provocado, frear esse tio de conduta. As invasões têm o lado negativo? Tem. Às vezes não é só uma reivindicação por terra e trabalho. Às vezes interesses pessoais é que estão por trás. A reação do Estado tem que ser comedida, inteligente e quem tem que ter racionalidade é o Estado brasileiro e os órgãos funcionarem bem para não deixar as coisas desandarem.

 

 

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