A reforma da Previdência proposta pelo presidente Jair Bolsonaro é a que mais ataca os privilégios da elite do funcionalismo público. E são esses, segundo o ex-ministro da Previdência, Roberto Brant (foto), os têm poder, que fazem pressão e ameaçam, sem ficar deitados na calçada ou impedindo o trânsito. Brant adverte que Bolsonaro precisa agir rápido para conseguir reunir uma base consistente para aprovar a reforma. E lembra que, mesmo com o governo querendo imprimir uma nova maneira de se relacionar com os parlamentares, nenhum presidente conseguiu se manter no cargo sem o apoio do Congresso Nacional.
A reforma da Previdência apresentada pelo presidente Jair Bolsonaro tem chances de passar?
Ela é uma reforma que ataca, principalmente, os benefícios da elite do funcionalismo público, ou seja, pessoas muito mais poderosas que os trabalhadores da iniciativa privada. É de se prever que haja uma reação muito grande desses grupos. A reação deles não se dá por movimentos de rua. Ninguém vai ficar deitado na calçada ou na rua para impedir o trânsito. Não é desta forma que eles reagem, mas eles têm uma influência muito grande no governo. Eles pressionam, eles ameaçam. Tem aí todo o Ministério Público, toda a magistratura, toda a diplomacia, todos os auditores fiscais, os advogados da União e dos Estados, todo pessoal graduado da polícia. A reforma atinge essas camadas mais poderosas do país. São as pessoas que tem privilégios. E pode se aposentar em condições muito mais favoráveis do que o trabalhador, o brasileiro comum.
Como é essa proporção?
Tem mais ou menos um milhão de funcionários públicos por aí. Os que podem ser considerados, os que tem privilégios, não são nem 200 mil. Existe uma massa muito grande de trabalhador do serviço público, que não tem altos salários, altas posições. Acho que haverá uma reação muito grande. Por outro lado, existe uma confiança muito grande da sociedade no Bolsonaro. Eles votaram nele com uma proposta de mudança e ele está comunicando à nação que a primeira mudança que ele tem a fazer é na Previdência. Por que? Porque o Brasil é o único país do mundo que gasta metade de todos os impostos só para pagar a Previdência. Como o Estado nessa condição ficou falido, nota-se que o Estado não pode mais prestar serviços. Minas, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul não têm dinheiro para o serviço de saúde, educação, segurança e a União não tem dinheiro para consertar as estradas, não tem dinheiro para consertar pontes e o país está parado. Se não fizer a reforma da Previdência, o país ficará, rigorosamente, sem futuro. São essas duas forças que se contrapõe: os interesses de 200 mil pessoas, não mais do que isso e os interesses de 220 milhões de brasileiros, que precisam do Estado recuperando o seu poder de investir. Examinando essas duas forças e que Bolsonaro tem um crédito de confiança muito grande com a população, nesses primeiros meses, ele tem grande chance de fazer passar essa reforma. Se ele deixar mais para frente, aí eu acho impossível. Mas agora, há uma chance muito boa.
O presidente Jair Bolsonaro tem essa base no Congresso Nacional para aprovar a reforma?
Ele não tem essa base, não porque não gostem dele, é porque ele não articulou base nenhuma para inaugurar um novo estilo de governar. Ele escolheu os ministérios segundo os critérios que ele considerou como os melhores, levando em conta a qualificação profissional, o currículo, na maioria dos casos relevantes. Ele colocou o Paulo Guedes, o Sergio Moro, pessoas sob as quais ninguém pode contestar. Pode até não gostar, mas não pode contestar a qualificação. Acho que sem os deputados aliados do governo é algo que não vai durar. Não há governo que funcione sem o Congresso. É um desencontro inicial e acho que progressivamente, a maioria vai se aproximar do governo, porque senão, o governo não vai a lugar nenhum. Se não passar a reforma da Previdência, esse governo está morto. Esse e qualquer um. É impossível governar o país sem a reforma da Previdência do tamanho desta que está sendo proposta. Isso é uma verdade para o Brasil, para o estado de Minas Gerais, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Goiás, é generalizado.
Com as mudanças na relação do trabalho, a arrecadação do INSS também tende a cair?
O que prejudica o INSS, a longo prazo, é a diminuição do trabalho. As empresas cada vez contratam menos para produzir a mesma quantidade de coisas. São os robôs, a inteligência artificial e toda essa tecnologia. Isso é que prejudica o INSS. Mesmo se o INSS estiver a todo vapor, o drama é que, felizmente, as pessoas estão vivendo muito mais. Quem se aposenta com 60 anos, segundo o IBGE, têm em média, uma sobrevida de mais 25 anos, seja homem ou mulher. A mulher vive ainda um pouco mais. A Previdência foi criada para ser gozada em um período mais curto. Antigamente, as pessoas morriam com 60 anos, 65 anos, aposentavam e em seguida morriam. Hoje, essa é uma tendência mundial, e o sistema previdenciário no mundo inteiro está em total desequilíbrio, sem chance de se reequilibrar, a não ser que se mude as condições para a aposentadoria. Nessa reforma, não há praticamente nenhuma mudança para o setor privado. O foco dessa reforma é o setor público. Para o INSS mudou o tempo de aposentadoria, com uma transição de 10 anos e só vai vigorar plenamente em 2030. Para o setor público ela é dura, porque impõe uma contribuição previdenciária grande. Para os que entraram no serviço público, desde 2003, a aposentadoria é igual a do INSS.