O Brasil tem dificuldade para voltar a crescer. As indústrias estão trabalhando abaixo da capacidade instalada das fábricas, o desemprego continua afetando milhões de brasileiros e as medidas tomadas até agora parecem não ter surtido efeito. Para o economista e presidente da revista Mercado Comum, Carlos Alberto Teixeira de Oliveira (foto), os remédios adotados nos últimos 40 anos são para países maduros e desenvolvidos, não para uma sociedade nova como a brasileira. O resultado é o mesmo de um cachorro correndo atrás do próprio rabo, em outras palavras, não sai do lugar.
O PIB ficou abaixo do esperado e o crescimento econômico não está acontecendo com a velocidade que se esperava. Houve um excesso de confiança?
Nos últimos três anos nós temos presenciado uma situação que é bastante interessante. O ano começou com um otimismo desmesurado. Quando Temer assumiu, vários economistas e até o relatório Focus ( do Banco Central) previa um crescimento na faixa dos 3%. Alguns economistas chegaram a estimar um crescimento de 3,5%. Mas ao longo do tempo foram acontecendo novidades como a greve dos caminhoneiros, a crise na Argentina. Agora estamos tendo o coronavirus na China. Na verdade, nunca nós tivemos um período tão longo de queda do PIB tão forte com período subsequente de lento retorno da atividade econômica. Alguns economistas chegam a dizer que isso aí é uma proteção. No período de 2015 e 2016, o Brasil experimentou uma queda de 8% e nos últimos três anos, o crescimento máximo foi de 1,3% ao ano, em que pese tivemos as expectativas de crescimento de até 3%, que no meu ponto de vista era até factível.
O porquê dessa dificuldade de o país voltar a crescer?
A máquina de crescimento econômico -venho dizendo isto há muito tempo- está velha e alquebrada e o Brasil desaprendeu a crescer de uma forma vigorosa e contínua, de forma sustentável. Em um cálculo recente que fiz, estimando que a economia brasileira vai crescer 2,4%, que é a estimativa do governo, e que cresceria 2,3% no ano passado, mesmo assim, vamos encerrar essa década, que termina no final deste ano, com um crescimento de apenas 9%. O que é muito pouco quando se compara o Brasil com o crescimento que o resto do mundo teve. Nesse período o Brasil, tendo crescido 9% não é nada, quando se compara com o que o mundo cresceu, que foi em uma média de 42%. As economias consideradas em desenvolvimento nesses 10 anos cresceram 60%. O mais assustador é que quando se faz um retrospecto das últimas quatro décadas, considerando que o ano ainda não terminou, o Brasil cresceu menos do que a média mundial. Nesses 40 anos a economia brasileira cresceu apenas 71%, ela dobrou e acrescentou mais 31%. A média mundial nesse período foi de 295%, ou seja, quase que triplicou. Nos países chamados emergentes, e em desenvolvimento esse crescimento foi de quase 500%. Foi de 484%. Nós estamos ficando para trás.
Onde está o erro?
O país tem uma altíssima concentração de renda, problemas estruturais seríssimos. Nós continuamos com obsessão atávica em busca permanente da estabilização, e às vezes pelo ajuste das contas públicas. Repete o que aconteceu em Portugal, na época de Salazar com moeda estável, com a economia com inflação relativamente baixa, com as contas públicas sob controle, em ordem, só que a economia não crescia. Ao final de 40 anos de governo, Portugal se tornou o país mais atrasado da Europa. É isso que está acontecendo. O Brasil, em vez de qualificar seu gasto público e investir na economia, fazendo investimentos que possam ser produtivos, não. O que aconteceu é que o governo adotou uma política monetária um tanto quanto suicida, com juros absolutamente extorsivos, os maiores já praticados na história mundial. Só no período do Plano Real para cá, o Brasil gastou com juros da dívida pública o equivalente a US$ 2 trilhões, o que equivale a um PIB anual. Imagina se um quarto disso aí, tivéssemos aplicado em infraestrutura. O Brasil seria outro. O grande problema é a falta de crescimento. Não vou dizer que nós temos que buscar o crescimento da época de JK, quando o Brasil cresceu a uma média anual de 8%. Mas a meta principal seria a de buscar o crescimento econômico de forma vigorosa, contínua, consistente e sustentável. Estou dizendo isto há 30 anos. Entra governo e sai governo, continua a mesma cantilena de sempre. A economia está definhando, entrou em um círculo vicioso. Quando tem um crescimento, é um crescimento de voo de galinha.
Onde o ministro Paulo Guedes está errando?
Vou repetir uma frase de Juscelino Kubitschek: “ pretender solucionar a crise brasileira com remédios prescritos para o único fim de estabilidade, como se fossemos manter uma terra exausta e um povo cansado, necessitado, desequilibrado, com poucas forças que ainda nos restasse, é semelhante as deformações que acarretam todas as analogias, ou no intento de se tratar as crises da puberdade, com medicamentos destinados a medicar a senectude”. Estão sendo adotados remédios não adotáveis à economia brasileira. Estão querendo aplicar aqui, lamentavelmente, receituário para países maduros e países desenvolvidos. Estão querendo aplicar políticas monetárias como aplicaram ao longo desses últimos 40 anos, que não são compatíveis com a nossa realidade econômica. Esse é o problema. Nós somos um país jovem, que está sendo construído. Não podemos nos comparar a um país já amadurecido. Não somos uma Áustria, que não permite nem cinco metros de asfaltamento, nem um leito hospitalar, porque não comporta. Esse é o grande problema.
Estamos no rumo errado?
O mais importante é ter crescimento econômico para gerar mais emprego, renda, aumentar a arrecadação e consequentemente, equilibrar as contas, produzindo mais. Nós temos que investir na produção. O Brasil precisa retomar a sua capacidade industrial, que foi reduzida a um terço. Se não houver uma mudança na mentalidade brasileira, se não desideologizarmos , se nós despolitizarmos a discussão econômica, voltando para o conceito básico primeiro, elementar, que é o crescimento econômico vigoroso, forte e contínuo, nós não vamos sair do lugar onde estamos. O que acontece é igual a um cachorro correndo atrás do próprio rabo. É um círculo vicioso, uma armadilha perversa que foi criada e que precisa ser desarmada. O investimento produtivo deve vir em primeiro lugar. Vir com teorias monetárias, muitas das quais estão obsoletas, inclusive nos países de primeiro mundo. Chicago já passou do seu tempo.