O aumento da inflação tem pesado no bolso do consumidor. O reajuste nos preços de produtos alimentícios, do gás de cozinha e da energia elétrica fizeram o orçamento doméstico explodir. Ainda assim, a economia dá sinais de recuperação. Para o ex-ministro de Planejamento e professor da Fundação Dom Cabral, Paulo Paiva (foto), são muitos os fatores que têm interferido na economia, que vão além da pandemia da Covid-19. (Foto reprodução internet)
A taxa Selic sofreu um aumento, a inflação está acima da meta, e os preços não param de subir. O que esperar da economia brasileira?
Apesar desse cenário, a economia neste ano, segundo a estimativa do PIB do IBGE recente, para o primeiro trimestre, mostra que a economia está em um processo de crescimento. Essa melhora é em razão do ciclo de commodities. Aumentou a demanda pelas commodities, tanto agrícola quanto minerais, do Brasil. O preço do minério de ferro está muito maior do que estava no pico do ciclo de 2010 e neste ano, está acima do que se esperava. Isso de um lado é bom, mas tem o outro lado e temos alguns fatores de riscos para esse crescimento da economia. Nós temos alguns riscos que estão à nossa frente e é preciso que eles sejam avaliados e acompanhados. O primeiro deles é a cobertura da vacina. Nós temos uma baixa cobertura de vacina e isto mantém ainda parte da população isolada. Isso tem efeitos sobre, principalmente, o consumo e sobre a reinserção de uma camada significativa da população no emprego. Parte da população perdeu o acesso à geração de renda, seja os trabalhadores informais, ou trabalhadores empregados. Então, quanto mais rápido e mais ampla for a cobertura de vacinas, mais seguro fica esse caminho de crescimento, com a volta dos empregos.
O outro fator?
O outro fator é a crise climática. Este período longo sem chuva, indica o risco de racionamento de energia à frente. Isso é um fator sério para o crescimento da economia. O terceiro é a inflação e a política monetária, esse lado monetário da economia. A inflação de fato surpreendeu negativamente. Nós estamos vindo desde o fim de maio do ano passado, com a subida de preços causada por vários fatores. Certamente a desvalorização do real é um desses fatores, associado aos preços de energia, e principalmente aos preços do petróleo e seus derivados. Essa combinação de reajustes, junto com o aumento de preços de commodities, principalmente as de consumo interno, como as commodities agrícolas, fizeram essa subida nos preços. O preço do milho, por exemplo, teve um efeito em cadeia para a produção de proteína de consumo interno. Ela ficou mais cara. Esse processo está num nível maior do que se esperava. No mês de maio nós chegamos com a inflação acima de 7%, que é muito além do que estava vindo lá atrás, que era de 3%. Isso traz uma preocupação grande, e temos de acompanhar esse crescimento. O Banco Central está tomando as medidas que julga necessárias para conter esse aumento de preço. Uma dessas medidas do BC foi de subir a taxa Selic, que estava no nível mais baixo da história do Brasil. Ela ainda está baixa, comparado com nossa história, mas, possivelmente, nós vamos ter uma inflação no final do ano superior à meta estabelecida e por isso o Banco Central deve elevar a Selic novamente e aproximá-la da taxa de inflação para que se retome o equilíbrio da economia. Nós temos uma economia que está em recuperação, mas que enfrenta no curto prazo três grandes ameaças. Na verdade, são quarto ameaças. A cobertura de vacina, a ameaça da crise climática, ameaça da inflação e a quarta, que é a das incertezas políticas. Nós não podemos estimar o que pode acontecer, mas a cada dia temos novidades e isso afeta muito as decisões em relação ao consumo e aos investimentos. Nós vamos caminhando nesse quadro. O crescimento da economia, será, certamente em torno de 5%, mas temos essas ameaças que podem comprometer o crescimento, principalmente mais no fim do próximo ano e para 2023.
O setor empresarial, pelo menos em Minas, está otimista em relação ao segundo semestre. Existem motivos para esse otimismo todo, diante desse cenário?
Do ponto de vista de crescimento da economia, para quem veio com economia que caiu 4,1% no ano passado, quando se vê alguma recuperação, dá para ficar realmente mais animado. Há um lado do comportamento, que é muito mais do mercado do que dos empresários, de quem produz, que é uma certa euforia com a recuperação da economia fora do Brasil, coma recuperação das bolsas, que estão atingindo níveis bem mais altos, devendo chegar aos 140 mil pontos e, eventualmente, até o final do ano a 150 mil pontos. E isso faz com que haja essa euforia. Do lado de quem produz, eu creio que há uma mistura de análise subjetiva com a expectativa e com o sonho. O crescimento desse ano, não representa um crescimento real. Essa previsão de 5%, vai representar de 2,5% a 2% do ponto de vista de crescimento real, porque nós estamos vindo de uma queda de 4,1% no ano passado. Tem economistas que chamam esse movimento de carry- over, que é o crescimento a partir de uma base muito baixa, então é simplesmente a recuperação do que caiu anteriormente. Mas de qualquer forma é uma perspectiva positiva, mesmo com os riscos que nós temos.
Ou seja, sair do fundo do poço ainda pode demorar um pouco?
Acho que o fundo do poço ficou para atrás. A questão é se nós vamos conseguir manter esse crescimento. Eu cito como exemplo a inclinação de um avião quando ele está decolando. Se o avião estiver muito pesado, ele vai sair pouco do chão. Se ele tiver mais força nas turbinas, ele tem uma inclinação muito maior e vai subir mais. O que nós estamos discutindo neste momento é em relação a economia brasileira e aí você tem forças que estão segurando essa potência. A potência dos motores da economia. Nós sabemos que temos fragilidades muito grandes dentro desse motor. Se não forem aprovadas as reformas, aí nós teremos um outro problema, que é o fiscal e que pode jogar a economia para baixo. Nós vamos ter uma outra queda, como tivemos antes. Se nós olharmos para os dados da pandemia, era de se esperar que no primeiro trimestre deste ano a economia seria um horror, porque nós tivemos crescimento no número de contaminados e um o número de óbitos muito maior do que nós tivemos em março, abril, maio e junho do ano passado. Isso trouxe insegurança. Acho que a população relaxou com o isolamento social. Hoje nós temos um isolamento social muito menor do que ano passado. O momento é de muita incerteza. (Foto reprodução internet)