O brasileiro tem passado por emoções intensas de raiva, indignação, cobra respostas e punições. Em outros momentos mostra-se apático, quase desinteressado. Essas turbulências internas começaram com a crise política e econômica brasileira que custaram o emprego de 14 milhões de brasileiros e foram intensificadas com as denúncias de corrupção desvendadas na operação Lava jato, envolvendo grandes empresas e empresários e praticamente toda classe política brasileira. Assimilar tudo isso não tem sido fácil e muitas vezes alguns se deixam levar por grupos como os coxinhas e os mortadelas, que apoiam grupos políticos, com uma postura quase que infantilizada, segundo o ex-presidente do Conselho Federal de Psicologia, Ricardo Moretzsohn, que tem estudos na área de comunicação. Mas entender como o brasileiro está processando todas essas informações não é uma tarefa tão simples.
O brasileiro passa por vários momentos devido à crise política e econômica, passando por momentos de revolta ao da apatia. Além disso temos os coxinhas e os mortadelas, que travam uma batalha a parte. O brasileiro está mais distante devido ao excesso de informações e denúncias e a evolução dos processos?
Estou tentando entender esse momento, e às vezes penso que tem essa apatia. Não sei se é pelo excesso de informações, porque acho complicado que as pessoas, de forma geral, tenham só uma versão, uma narrativa única. De certa forma estou falando de mecanismos midiáticos, porque as pessoas, de maneira geral, tendem a aderir a determinados coletivos por um processo que chamamos de identificação, ao se identificarem com aquilo que parece familiar, conhecido. Essa é uma tendência natural. As pessoas se agregam a grupos nos quais tenham que compartilhar. Nesse sentido, as pessoas funcionam como blocos e tem a capacidade de ter posições críticas e acho fundamental que as pessoas não abram mão de serem críticas, no sentido de não achar que tudo seja natural.
Essa situação se dá no caso dos coxinhas e dos mortadelas?
Acredito que sim. Nós estamos vivendo um momento histórico muito importante no nosso país e algumas pessoas se sentem meio perdidas, desorientadas. Essas pessoas buscam referências e uma referência pode ser a adesão a um coletivo por identificação e outra referência. É importante que as pessoas não percam a capacidade crítica, porque me parece que essa posição de engolir tudo, sem crítica é uma posição infantilizada. As pessoas às vezes infantilizam porque perdem a referência. Nesse sentido, considero importante, independentemente de ser coxinha ou mortadela, as pessoas precisam assumir o protagonismo do seu próprio futuro. A população é manipulada o tempo inteiro e isso pode ser um perigo do ponto de vista social, porque quando as pessoas perdem as referências, é onde se abre a possibilidade do fascismo, do surgimento de um Hitler, porque as pessoas tendem a referência em um líder, ou líderes, e isto é muito nefasto, muito ruim. A posição crítica leva a maturidade.
É preciso analisar todos os lados da questão?
Seria construir a própria opinião pela diversidade de informações.
Percebemos nas redes sociais que as pessoas selecionam os “amigos” e mantém os que dividem a mesma opinião, rejeitando o que não pensa igual. Esse comportamento é ruim, limitante?
Exatamente. É a identificação com os grupos, seja de direita ou esquerda. “Eu só recebo e só entro nas redes sociais do que me interessa”. A pessoa entra em um processo de retroalimentação acrítica e faz com que a pessoa não saia do lugar e, por outro lado, saia da posição de sujeito para a de um objeto a ser manipulado por um interesse maior.
Quando surgem denúncias como a de Joesley Batista, da JBS, há uma espécie de indignação generalizada. Esse tipo de informação dá uma chacoalhada, uma misturada entre os que tem posições diferentes?
Eu acho que não. As pessoas percebem, tem um sentimento de que tem alguma coisa errada, porque elas estão sentindo, principalmente na economia, no bolso. Quando se verificam as notícias da delação premiada de Joesley Batista, o que tem diferencial enorme aí é o montante de dinheiro envolvido nesse processo. Quando o volume de dinheiro é menor, mais voltado para a nossa realidade parece que fica mais palatável. Na questão do Joesley o volume de dinheiro é de uma ordem de grandeza que nós nunca vimos. O volume de dinheiro envolvido impacta. Daí é que vem uma certa revolta em relação ao empresário e da sua delação. É um dinheiro que faz falta na saúde, na educação. Com o número de desempregados que nós temos hoje no Brasil, com tantas necessidades, nós temos bilhões e bilhões não só com Joesley, mas com toda essa corrupção e com um governo que não consegue se sustentar. Não adianta, não vai chegar nenhum salvador da pátria. É preciso que as pessoas sejam protagonistas das suas vidas e construam o seu futuro e não percam a capacidade crítica e tentem se informar não só por uma narrativa única.