A chamada PEC da Vingança assombrou por um bom tempo membros do Ministério Público. A Proposta de Emenda a Constituição daria maior controle do Congresso Nacional sobre o Ministério Público e de operações como a Lava Jato, que levou à prisão políticos como o ex-presidente Lula e grandes empresários brasileiros, pessoas consideradas, até então, intocáveis. O procurador-geral de Justiça de Minas, Jarbas Soares Jr (foto), afirma que em uma leitura cuidadosa das mudanças propostas, fica clara a intenção de se atingir a Lava Jato. Mesmo com a derrubada da proposta, Jarbas Soares Jr entende que o tema merece uma reflexão maior.
Após a derrubada da chamada PEC da Vingança, o assunto parece que ainda não está encerrado. Essa vitória foi importante para o Ministério Público?
Não considero uma vitória do Ministério Público neste momento. Considero que nós tivemos a capacidade de demonstrar, a parte da Câmara dos Deputados, que a PEC não vinha aprimorar os controles do Ministério Público. Temos outras formas de aperfeiçoar o sistema de controle da instituição e isso foi muito importante, porque a PEC, no início tinha uma conotação, foi criada uma comissão especial e na última hora saiu um relatório com situações absolutamente inaceitáveis ao modelo constitucional do Ministério Público brasileiro. Foi quando a instituição reagiu e teve o apoio da sociedade, especialmente porque interferia na atividade, na sua autonomia e independência, colocando a instituição subjugada a um órgão administrativo. Para nós, não há nenhuma dificuldade de se ter uma fiscalização administrativa e financeira no Ministério Público, mas a atividade fim, só o Poder Judiciário pode controlá-la.
O presidente da Câmara Arthur Lira disse após a sua derrota na votação, que o jogo só termina quando acaba. É um recado de que o assunto ainda não está encerrado?
O presidente Arthur Lira, que é meu amigo pessoal, conduz dentro da Câmara um sentimento sobre os erros do Ministério Público. Ao meu juízo, com todo respeito, estão sendo ignoradas as virtudes do Ministério Público. Sei que o Poder Legislativo pode tomar várias atitudes e o próprio Ministério Público define o parlamento, mas não pode ser um jogo de ataque e contra-ataque. É uma instituição que custa caro para a sociedade e devolve muitos serviços à sociedade e é fundamental para a democracia e deve ser tratada assim. Nós estamos dispostos a conversar e corrigir nossos erros, mas não podemos aceitar nunca que esse modelo Constitucional, que tem seus erros, mas tem enormes acertos e tem funcionado para a sociedade ser menosprezado. Faço a seguinte pergunta: O Brasil seria melhor ou pior sem o Ministério Público?
Essa não foi a primeira tentativa de interferência no Ministério Público. Por que esse interesse na interferência política no Ministério Público?
O Ministério Público adquiriu status constitucional de instituição permanente e representa uma espécie de causa pétrea da Constituição. Temos o Supremo Tribunal Federal como o guardião, temos o Poder Legislativo, com o sistema bicameral, com o Senado que também pode fazer essa moderação de projetos oriundos da Câmara dos Deputados. O que acontece é que muitas vezes o Ministério Público desagrada o poder econômico, o poder político, porque é justamente esse o seu papel, de contestar e agir corrigindo irregularidades, em nome da sociedade. A meu ver, as pessoas estão ficando cegas ao não enxergar que a instituição é muito maior do que qualquer atitude pessoal ou até mesmo de uma operação como a Lava Jato. O Ministério Público é muito maior do que a Lava Jato e se vê nitidamente nos artigos que estavam nessa reforma no Conselho Nacional, uma reação a própria Lava Jato. Basta ler o artigo para se ver a ação delineada contra os atores da Lava Jato. Isso não é bom, isso cega.
A Lava Jato foi um erro?
Não. Mas a Lava Jato também errou. Mas também teve muitos méritos. O que se viu foi pessoas que pareciam inalcançáveis sendo processadas, julgadas, condenadas e presas. Pessoas que nunca tinham andado em um ônibus na vida ou em um avião de carreira, estavam respondendo à Justiça. Não foi uma operação de mil e uma virtudes. Ela teve seus equívocos e a reação que se viu na Lava Jato e em situações localizadas em municípios do Brasil, acaba gerando uma polêmica maior do que ela é. Todo mundo tem uma reclamação contra o Ministério Público, contra o poder Judiciário, contra o Poder Legislativo e contra o Poder Executivo, nem por isso vamos acabar com essas instâncias que são o Poder de uma sociedade organizada.
No interior existem muitas reclamações de envolvimento político. Isso acontece?
Não acredito em envolvimento político, talvez seja um excesso de ações bem intencionadas, exatamente porque está se construindo esse modelo para se preparar para uma ação nova, uma lei nova, que atribuem ao Ministério Público determinadas atitudes. O Ministério Público terá que aprender fazendo aquilo que é quase uma volta ao banco de faculdade para estudar, mas os instrumentos vão sendo corrigidos ao longo do tempo. Mas o que vemos é as pessoas se apegando aos detalhes, a ações isoladas e não se enxerga o conjunto da obra. O Ministério Público reconhece seus erros, inclusive, apoiou a criação do Conselho Nacional do Ministério Público, que é o órgão externo de controle, composto por outros membros de Poderes, inclusive, e apoia o código de ética, que o Congresso Nacional está cobrando. Nunca fomos contra o código de ética, temos uma legislação disciplinar muito rigorosa, mas se apegam em casos isolados, na Operação Lava Jato, na conduta de um promotor ou de um procurador. O promotor, normalmente, quando chega em uma cidade, ele nunca pisou lá antes. Por acaso está lá e enxerga na sua ação, uma ação política. Já fui acusado de ter sido petista, tucano e agora, sou Novo. Não sou nenhum dos três. Sou Ministério Público.
O Ministério Público sai mais forte depois da votação da PEC da Vingança?
Acho que não. Mas nós saímos desse momento para uma reflexão maior porque, querendo ou não, quase 300 deputados quiseram criar um modelo que seria praticamente o início do fim do Ministério Público da Constituição de 1988 e alguns mal intencionados pensando que a ideia representaria uma reformulação do Ministério Público. Acho que temos que aperfeiçoar sempre as instituições democráticas e não piorá-las. O remédio que foi dado é muito maior do que a doença e assim acaba se tornando um veneno. Há muito tempo, parte da Câmara corrigiu, nós tínhamos esperanças que no Senado os 81 senadores fariam uma correção de rumos, mas não precisou. Mas temo que entender que esse foi um alerta e fazermos o dever de casa, errar menos e fazer mais. (Foto reprodução internet)