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Síndrome do raquitismo econômico

Os principais problemas econômicos brasileiros não são apenas de natureza conjuntural, como à primeira vista sugere a situação atual. São, notoriamente, estruturais e decorrem de vários entraves que obstaculizam o crescimento mais vigoroso da economia nacional, impedindo o País de trilhar os caminhos que possam levá-lo ao desenvolvimento e ao progresso de sua sociedade.

 

Presenciamos, até alguns anos atrás, a falsa impressão que o Brasil crescia de forma avantajada, diferenciando-se positivamente em relação ao resto do mundo. Esta situação decorreu do fato de o País ter sido beneficiado pela forte valorização das principais commodities, das quais é grande produtor e, também pelo excepcional desempenho verificado na economia mundial. De 2004 a2007, a economia mundial cresceu, na média, 5,2% ao ano, tendo sido esse período considerado o de maior expansão econômica de todo o século passado. Na mesma ocasião, o Brasil cresceu a uma taxa média anual de 4,8% – cabendo, no entanto destacar que, mesmo tendo sido uma expansão expressiva, tal circunstância não foi a necessária para que ele pudesse superar a média mundial.

 

Nestas considerações há, ainda, de se ressaltar a forte valorização do real em relação ao dólar norte-americano, apurada durante basicamente toda a primeira década dos anos 2000 ocasionando, por isso, uma ampliação nominal significativa do PIB – Produto Interno Bruto nacional. Quando contabilizada nessa moeda, nossa produção total de bens e serviços saltou da 12º posição no ranking internacional para o 6º lugar entre as maiores economias mundiais. Na verdade, o que ocorreu foi uma simples ilusão de ótica monetária, associada a uma percepção errônea de que já havíamos nos transformado numa grande potência econômica.

 

Pode-se depreender que o Brasil não vem, principalmente a partir deste novo século, acompanhando o ritmo de expansão da economia mundial e encontra-se em desvantagem quando o assunto se refere à expansão de sua economia. O PIB brasileiro tem crescido em níveis inferiores as médias mundiais e muito aquém de nossas potencialidades. De acordo com recentes estimativas do FMI – Fundo Monetário Internacional o País deverá experimentar, em 2014, um crescimento basicamente nulo, contabilizando uma taxa em torno de 0,2% – o que destoará fortemente do ritmo da economia mundial, que vai expandir-se em 3,3%. A situação fica mais grave se analisarmos o desempenho nacional sob a ótica do nosso crescimento populacional, previsto em 0,86% neste ano segundo, o IBGE – o que implica afirmar, então, que registraremos um declínio na nossa renda per capita – ou seja, teremos ficado, em termos individuais, 0,65% mais pobres em 2014.

 

Destaque-se que as projeções atuais mais otimistas já apontam que o ano de 2015, em termos econômicos, não será muito diferente do que o atual, podendo até mesmo ser pior, devido aos ajustes necessários nas contas públicas. E, também, é bastante provável que a nossa renda per capita continuará, assim, em trajetória declinante.

 

Para efeito ilustrativo, estudos divulgados pelo FMI através do documento intitulado World Economic Outlook, de outubro último, revelam que, no período de 2001 a2014, a economia mundial registrará crescimento acumulado de 66,7%. Os países emergentes, os quais o Brasil integra, estarão obtendo uma expansão acumulada de 122,94%. Já a América Latina terá crescido, no mesmo período, 56,3% e o Brasil 52,2% – o que é muito pouco para se comemorar. Em síntese, tivemos uma performance bem típica de rabo de cavalo, quando só se cresce para trás e para baixo.

 

Relembro JK: “Temos de acelerar o passo, integrando-nos num ritmo de crescimento mais rápido. Cumpre-nos procurar, a todo o transe, o socorro da técnica moderna. Temos de ocupar, nos mapas econômicos e políticos, uma posição correspondente à nossa importância territorial e demográfica”.

 

Reverter esta trajetória de baixo crescimento econômico é, no meu entendimento, o maior desafio nacional. Não basta apenas estabilizar a moeda, manter o câmbio sob controle e buscar o equilíbrio das contas públicas. Esses são componentes essenciais, mas não o bastante ou o suficiente para reconciliarmo-nos com o crescimento econômico vigoroso. Durante os 41 anos de governo Antônio de Oliveira Salazar (1933-1974) Portugal foi um dos países de economia mais estável, só que não conseguia crescer. Transformou-se, no entanto, em um dos mais atrasados da Europa. Portanto, para um País desenvolver-se é preciso bem mais do que a simples estabilização econômica.

 

Reputo, como uma das condicionantes básicas à retomada do crescimento econômico, a restauração da confiança empresarial, da credibilidade na atuação governamental e, fundamentalmente, na possibilidade de o País voltar a investir em torno de 25% do PIB em sua economia. Isso deve pressupor, ademais, o início inadiável das reformas estruturais e institucionais de que tanto necessitamos, para a modernização e melhoria da competitividade, com ênfase na ampliação da produtividade nacional. São deveres de casa que apenas a nós compete empreender, agora e imediatamente.

 

Outra questão de fundamental importância refere-se à reforma tributária. A Receita Federal acabou de divulgar o documento intitulado Carga Tributária Nacional – 2013, que considero importante pista para compreendermos a situação fiscal brasileira.

 

O referido estudo aponta que a “descarga tributária” brasileira atingiu, em 2013, 35,95% do PIB de R$ 4,84 trilhões – sendo equivalente a uma arrecadação de R$ 1,743 trilhão nas três esferas governamentais – cabendo à União 68,92% do total; aos Estados 25,29% e aos Municípios, 5,79%. Isso significa confirmar que de cada R$ 100,00 produzidos na economia nacional, R$ 35,95 foram destinados, exclusivamente, ao pagamento de tributos. Ou que, em todo o ano de 2013, 131 dias do trabalhador foram confiscados na remuneração dos diversos tributos cobrados no País.

 

Apesar de bastante elevada, a arrecadação tributária nacional ainda não cobre a totalidade das despesas públicas, restando saldos a descoberto, conhecidos como déficits nominais, os quais atingiram 3,3% em 2013 (e deverão superar 5% em 2014). 

 

Constata-se, através do estudo divulgado pela Receita Federal, que de 2001 a2013 a carga tributária brasileira já subiu 14,82%. A tributação nacional encontra-se concentrada na produção e no consumo, ocasionando o encarecimento das mercadorias e serviços, prejudicando as exportações e os investimentos em geral.  Essa concentração, equivalente a 18,43% do PIB ou a 51,3% de tudo o que se arrecada nacionalmente, supera os níveis tributários alcançados pelos países desenvolvidos, inclusive, daqueles que têm carga tributária total superior à do Brasil. De outro lado, há de se ressalvar que a tributação direta da renda no Brasil é considerada baixa para os padrões internacionais e representa apenas 6,51% do PIB – o que equivale a pouco mais da metade quando comparada à média dos países da OCDE – Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico. Taxar a produção é um dos grandes equívocos da legislação tributária brasileira.

 

O Brasil é um dos poucos países do mundo a taxar a produção industrial, como se ela fosse uma atividade criminosa e precisa ser penalizada. Em 2013, o IPI -Imposto sobre Produtos Industrializados representou 2,46% da arrecadação tributária, totalizando R$ 42,9 bilhões. Porque não transformá-lo em IPS – Imposto sobre Produtos Supérfluos, ocorrendo a sua incidência apenas sobre produtos considerados supérfluos, como fumo, perfumes, artigos de luxo, refrigerantes, bebidas alcoólicas e outros congêneres, liberando-se as demais produções industriais desse ônus?

 

Finalizando, merece ainda citação, estudo recente divulgado pela FIESP – Federação das Indústrias do Estado de São Paulo revelando que a representatividade da indústria brasileira no PIB nacional caiu de 25,5% em 1983 para 13,1% em 2013 e que, nesse período, apenas um país em todo o mundo – a Polônia – com 12%, superou o Brasil em desindustrialização.

 

A indústria, notadamente a de transformação, é peça-chave estratégica para que o Brasil retome taxas de crescimento econômico mais vigorosas, consistentes e contínuas e, assim, alcançar o desenvolvimento. Se assim não procedermos, continuaremos sofrendo dos males decorrentes da síndrome do raquitismo econômico, conduzindo-nos a uma situação de ananismo que não podemos aceitar nem mais tolerar.

 

O desenvolvimento precisa retomar à agenda nacional, como a mais relevante de todas as nossas metas.

 

Carlos Alberto Teixeira de Oliveira

Economista, presidente da ASSEMG-Associação dos Economistas de Minas Gerais e do IBEF-Nacional – Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças. Presidente MinasPart-Desenvolvimento Emp. e Econ. Ltda

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