Exatamente quando a presidente Dilma anuncia elaboração de um programa para ajudar na recuperação da economia, através de financiamentos no setor da construção, portaria do Ministério da Aeronáutica engessa a atividade, criando sérias dificuldades para lançamentos de novos empreendimentos. Belo Horizonte então, a prevalecer as novas regras, vai sofrer forte queda na área da construção.Como se não bastasse a portaria restritiva, a Aeronáutica quer ainda examinar todos os projetos de construção que se situem dento de um determinado raio em relação aos aeroportos. Quer analisar e opinar, mas não tem gente para este trabalho. E tudo vem, segundo o diretor de Legislação Urbana do Sinduscon-MG, Athos Martins Bernardes (foto), num momento em que o setor da construção civil enfrenta sua maior crise. A crise é tamanha que este é, para quem tem dinheiro, o momento ideal para ir às compras no setor imobiliário.
A portaria 957 do Comando da Aeronáutica limita a 45 metros a altura para a construção de edifícios em um raio de até quatro quilômetros da pista de pouso dos aeroportos. Como ela impacta a construção civil em Belo Horizonte?
Essa portaria foi emitida pela Aeronáutica neste ano e estabelece regras internacionais que dizem respeito a segurança aérea. Essas regras estão sendo adaptadas no Brasil, mas são muito conservadoras porque foram escritas para aeroportos que não ficam dentro das cidades, igual o aeroporto da Pampulha. O padrão americano é de aeroporto afastado. O que acontece é que existiam restrições impostas pela Aeronáutica na construção de edifícios nas proximidades de aeroportos, mas como decidiram adotar as normas internacionais ficou muito ainda mais restritiva, a construção de prédios. Da pista do aeroporto é traçado um raio de 15 quilômetros, impactando até o Belvedere. Desse ponto é traçada uma linha imaginária com 2% de inclinação e só se pode construir, o que foi dentro desta linha, prédios com 50 metros de altura, ou um prédio de 15 andares. Essa linha imaginária ignora a topografia da cidade. Tem lugares em que fica impossível construir, porque o aeroporto da Pampulha fica em uma área baixa. O Belvedere, por exemplo, está em uma região alta e, por isso, qualquer construção lá acaba infringindo a regra e nesse lugar a Aeronáutica fala que nem pode construir. A prefeitura de Belo Horizonte fez um estudo de geoprocessamento e basicamente 70% de Belo Horizonte tem restrição e só se pode construir, no máximo, com 45 metros de altura.
Como resolver esse problema?
A Aeronáutica alega que não está proibindo, mas quer ser informada e dar permissão para iniciar a construção. Fui a Brasília tentar encontrar uma solução. Mas eles alegam que não haverá problemas, e que é só enviar os projetos. Só que sem a Aeronáutica aprovar, a prefeitura não vai liberar o alvará. Hoje eles recebem em torno de 100 processos por mês e demoram em média 120 dias para responder cada processo. São emitidos, por mês, em Belo Horizonte, 250 alvarás. Se 70% desse volume tem que ir para Brasília para aprovação, nós podemos falar com tranquilidade que serão 200 processos por mês. Só que não tem processo só de Belo Horizonte. Tem de Goiás, Tocantins e Distrito Federal. Vai ser um número estratosférico de processos que vão para o mesmo local.
Essa norma pode paralisar as construções em Belo Horizonte?
Essa é a nossa leitura. Se continuar dessa forma, vai paralisar. Atualmente é normal se demorar um ano para ter aprovado um projeto na prefeitura. Se nós formos esperar a aprovação em Brasília, vai ser mais um ano, já que a tendência é a de triplicar os processos na Aeronáutica. Outra preocupação é o fato de que na Aeronáutica são todos militares e não tem uma pessoa contratada para revisar só esse tipo de processo. São oito militares que fazem as funções de resgate, salvamento e análise dos processos. Como não há verba para contratação de mais pessoal, e como eles não ficam exclusivamente na função, o prazo de 120 dias, que já é absurdo, vai triplicar nas mãos deles. Isso quando não há nenhuma pendência.
Nesse caso, para conseguir autorização para construir um prédio vai levar pelo menos dois anos?
É a nossa previsão.
A Aeronáutica apresentou alguma alternativa?
Quando fui lá disseram que iriam resolver e cogitaram até tirar Belo Horizonte da legislação, mas mantiveram a decisão. Nós vamos precisar da ajuda do poder público para resolver isso, ou o setor da construção civil vai parar.
Quantos projetos já deram entrada na Aeronáutica dentro desta nova regra?
Até agora nenhum. As construtoras estão em um ritmo lento e esta é uma novidade no setor e será difícil para as construtoras se adequarem ao processo. Fui à Brasília fazer um curso para aprender e a nossa ideia é a de tentar abolir essa norma.
Qual a expectativa do setor para este ano.
Não é boa. Da mesma forma que o restante da economia, a construção civil está sendo muito abalada devido a restrição de crédito pelos bancos e pela incerteza do comprador. O cliente quer comprar, mas não tem coragem de assumir um financiamento de 30 anos sem saber se daqui a dois meses terá emprego. A demanda arrefeceu. Em muitos casos, a pessoa está interessada, assina o contrato vai para o banco e na hora de ter o financiamento liberado pelo banco, são criados N entraves para não emprestar para aquela pessoa. O que está acontecendo hoje é que o cliente não consegue pagar o financiamento e não consegue o seu dinheiro, já investido, de volta, porque esse dinheiro virou juros, virou publicidade, virou comissão. E aí você tem que fazer o famoso destrato, que é péssimo. Porque a construtora perde o cliente e o cliente, por sua vez, não tem o seu dinheiro 100% devolvido. E isso tem acontecido devido à restrição ao crédito. As construtoras também enfrentam dificuldades para conseguir o crédito. Antes esse processo era muito mais tranquilo. Hoje os bancos fazem exigências descabidas, como a de vender 50% da construção antes da análise do projeto. Nós estamos tendo que vender o empreendimento antes de saber se teremos o financiamento.
O governo tem sinalizado para mudar essa situação?
A presidente tem falado de um novo PAC para estimular o crescimento, especificamente da construção civil, que no ano passado demitiu 500 mil trabalhadores. Nenhum setor teve um resultado tão ruim. Foi o pior resultado da história da construção civil, desde que começaram a fazer o mapeamento do Caged. Esse é um setor que tem como reagir rápido. Se o governo liberar dinheiro para obra pública, nós fazemos a licitação rapidamente. Mas o que nós vemos pela mídia é que não existe dinheiro.
O novo PAC que o governo pretende anunciar pode reverter a atual situação?
O Minha Casa, Minha Vida 3 seria anunciado em março de 2015 e nós não temos clareza até hoje. Não sabemos quais serão as regras, se o anúncio será honrado ou se é só uma notícia para acalmar o mercado, externo para ver se o dólar diminui. As construtoras não confiam nem um pouco no governo Dilma. Temos que ver para crer. Esse ano deve ser pior do que 2015. O PIB da construção civil vai diminuir ainda. Serão mais demissões, mais empresas fechando, menos venda de imóveis.
O setor vive o pior dos mundos?
Em outra ponta, o momento é muito bom para comprar apartamento, justamente por causa da crise. Se a pessoa tem dinheiro ou crédito, o momento é este. Todo mundo está dando desconto, está mais flexível com a forma de pagamento. A hora de comprar imóvel é agora.