A pandemia da Covid-19 continua a impor mudanças no comportamento do brasileiro para que ele possa vencer a doença. Apesar das resistências às medidas de isolamento social para conter a pandemia, o presidente da ACMinas, José Anchieta (foto) entende que esse é o papel do Estado: o de conduzir a sociedade para o melhor caminho. Mas pondera que no Brasil as coisas não caminharam bem e só agora, parece que há uma sinalização para o país tentar reverter a situação, porque está dando razão à ciência, mesmo que alguns ainda insistam em pensar o contrário.
O avanço da pandemia e, como consequência, a imposição do isolamento social, tem gerado muitas críticas. Como o senhor avalia essa situação?
O mundo se divide em duas metades: de um lado está a sociedade civil e de outra está o poder constituído, está a autoridade, o agente público, o Estado. O Estado na percepção filosófica somos nós. No Estado os cidadãos livres abrem mão de parte de sua liberdade, entregando-a para uma entidade organizada, superior, para que essa entidade superior coordene a vida coletiva de todos nós, atribuindo-lhe a suprema autoridade de nos regular e nos punir. Aí vêm as leis e as sanções da lei, que é produto daquilo que a sociedade concebe como estrutura de organização dessa própria sociedade. Isso é Estado porque Montesquieu falou, Carl Max falou, porque kant falou, porque Nietzsche falou, Maquiavel falou, isso é Estado porque todos os filósofos definiram Estado, cada um em uma linha ideológica e em um frontal filosófico, mas todos falaram a mesma coisa.
É toda uma estrutura a ser levada em consideração?
Estado somos nós representados para definir nossas licitudes e nossas caminhadas. Agora vamos falar dos empresários. Na sociedade tem aqueles que se sobressaem como empresários, aí vem um negócio chamado pandemia e temos que resolver a pandemia. O conceito de pandemia é uma doença que alastra e que a medicina ainda não tem cura. De uma maneira bem simples, é uma doença sem fronteira e sem cura. É preciso vencê-la e quem vence a doença é a ciência. Dá para a sociedade e o Estado brigarem com a ciência? Não. O mundo inteiro, a começar da China, tratou bem da ciência. A vacina que levava 16 anos para ser criada, foi criada em seis meses. Alguns agentes de Estado, descumprindo a sua função, fizeram gracinha com a doença. A começar do ex-presidente dos Estados Unidos, depois o primeiro ministro da Inglaterra fez chacota, depois foi o presidente do México e por fim o nosso capitão fez as dele. E como fez! A ciência, onde não brigaram com ela, chegou com a vacina pronta.
Não foi o que aconteceu no Brasil?
Aqui no Brasil até ontem, o presidente botinava com uma estupidez, com uma ignorância, com uma irracionalidade indigna de ocupar o posto em que ele ocupa. Internamente aconteceu de tudo. Teve troca de ministro, cloroquina e aglomeração. Todo cientista disse desde a primeira hora, que a aglomeração é que faz a festa para o vírus. O nosso presidente foi o maior agente aglomerador. Não tenho dúvida em dizer que milhares e milhares de mortes têm na ponta a irresponsabilidade desse capitão. Diz a ciência que não pode aglomerar, mas da Idade Média para cá, nós gregários que somos, somos aglomeradores, desde os momentos mais solenes, como somos aglomeradores dentro de um trem, da lotação, de um campo de futebol. A ciência falou que isso não pode, que isso faz o vírus proliferar. O Brasil não fez o dever de casa. Veio o Estado, com uma pobreza e em certa medida, com ignorância, decretou o fechamento. Mas é fato que em alguns lugares do mundo, principalmente na Europa setentrional em que fizeram o isolamento e, alguns ainda fazem pior, o lockdown. Nós, por ignorância de nossos mandatários federais, chegamos tarde na vacina. Poderíamos estar com a vacina mais adiantada? Claro que poderíamos. Não estamos devido a um comportamento errático de nossas autoridades.
As últimas mudanças podem alterar esse quadro no país?
Nas últimas horas, parece que houve uma guinada e estão tratando melhor desse assunto. Mas chegamos muito atrasados. Morre-se e morrerão muitos mais, porque chegamos atrasados. Não bastasse agora que o Brasil vai entrar nos eixos, a doença está no pico, por causa desse histórico do país. Nós vamos precisar de mais fechamento. O empresário é contra o fechamento? O empresário não é contra o fechamento porque não tem competência nem legal, nem social, nem científica para se posicionar contra o fechamento. É doloroso. Muitos não voltarão à sua atividade, porque não conseguirão reabrir as portas. Ora, se Estado nos lidera e nos pune, não tem o direito de ter outro compromisso, a não ser um só: o de debelar o mal. Destinar centavo por centavo do trilhão do orçamento nacional para que nós vençamos o mal.
Como?
É preciso dar dinheiro aos que não tem comida, sim é obrigatório e é ação de Estado. É preciso dar capital de giro para o empresário? O empresário também é cidadão. É preciso, é necessário e é obrigatório. Como estupidamente não fizemos investimentos em algo mais inteligente, onde o fechamento é necessário, ele há de acontecer, porque é um dos elementos para resolver o mal da pandemia. Enquanto isso, o Estado tem uma única obrigação, a de viabilizar recursos para quem não tem dinheiro para colocar comida em casa e para os que precisam estar em casa e tem que pagar salários. O Estado tem de cumprir a sua função de Estado e depois da pandemia, vamos reescrever o Estado.