Os estudos no tratamento do câncer estão cada vez mais avançados e mesmo com algumas terapias chegando com atraso no Brasil, médicos e clínicas são preparados para adotá-las. O presidente do Conselho Administrativo do Grupo Onconclínicas, Bruno Ferrari, que acumula as funções de médico e administrador, acredita no país e no trabalho desenvolvido nos 10 estados e no Distrito Federal, onde o Grupo atua. Todos os avanços tecnológicos e de terapias para tratar a doença são oferecidos aos pacientes. Mas o Brasil precisa de muito mais, segundo ele, precisa de políticos que tragam estabilidade ao país e permita os avanços na medicina. Bruno Ferrari (foto) sabe da importância desse trabalho e aprendeu a conciliar a atuação médica e a de executivo.
É possível conciliar o atendimento médico com a atividade do empreendedor?
A vida de empreendedor está intimamente ligada à do médico. Elas se cruzam e no fundo, tem o mesmo objetivo. A minha função hoje é , como presidente do Conselho de Administração do Grupo, coordenar um grupo de trabalho que visa vencer o câncer, o que está intimamente relacionado com o meu dia a dia. O meu lado empreendedor é lidar com colegas, lidar com o Dana-Farber Cancer Center, da Universidade de Harvard, com quem temos parceria. Toma tempo. O Grupo cresceu muito e mudou a sede para São Paulo e o que faz com que tenha que ir lá frequentemente, além das viagens internacionais. Um dos nossos sócios é a Goldman Sachs, que é o maior banco de investimentos do mundo. Mesmo na minha ausência, tenho uma equipe sólida São cinco médicos, que trabalham junto comigo olhando os pacientes. Parte desses médicos tem formação no exterior, e isso facilita a convivência dos dois lados. E tão importante quanto isto é a disponibilidade que eu tenho e sempre tive. Meus pacientes conseguem falar comigo 24h por dia, onde eu estiver. Me incomoda é saber que eles estão precisando falar comigo e não me ligam. Isso faz com que as duas facetas do Bruno Ferrari convivam bem.
O ambiente político no país atrapalha os investimentos?
Nós precisamos ter um ambiente mais favorável à pesquisa clínica no Brasil, que é importante em todos os aspectos. Primeiro, porque nós podemos aumentar as chances de curar os pacientes com novas drogas, que podem ser adotadas no futuro e não podemos ter leis dificultando isso. Um protocolo de pesquisas nos EUA demora quatro meses para ser aprovado, na Europa idem. No Brasil demora um ano. Mesmo assim, o setor privado de saúde continua investindo. O sistema privado de saúde faz parte da solução do atendimento ao paciente público, porque os hospitais públicos estão quebrados.
A crise alterou a procura de atendimento especializado, já que a classe média foi fortemente afetada?
Na realidade, a saúde é um mercado mais resiliente. As pessoas vão cortando tudo e deixam para cortar por último o plano de saúde e alimentação. Corta lazer, corta educação, corta o carro, mas tenta preservar a saúde. Se essa crise continuasse, é óbvio que afetaria a saúde das empresas e aí seria mais desemprego, menos pessoas tendo acesso à saúde suplementar. No nosso grupo, por exemplo, nós crescemos e crescemos porque investimos em tecnologia. A oncologia está mudando muito, daqui a 10 anos nós vamos estar falando de tratamento de terapias celulares. Nós preparamos o próprio organismo do indivíduo para combater a doença. Temos a imunoterapia, que é difundida no Brasil com drogas aprovadas. Hoje nós temos três drogas, pelo menos, que são imunoterápicos, que tira a trava do sistema imunológico do paciente, para ele mesmo combater a doença. O organismo mesmo reage contra a doença e hoje nós conseguimos coletar a amostra de sangue do paciente, preparamos a célula do próprio paciente para combater o câncer. Isso ainda não chegou no Brasil, mas já chegou nos Estados Unidos, mas em breve nós já estaremos tratando dos nossos pacientes com essa terapia, que não tem nada a ver com droga, tem relação com preparar as células de defesa do organismo para reconhecer o tumor e destruí-lo. Daqui há alguns anos, grande parte dos tumores serão tratados assim, sem quimioterapia. Pacientes que não seriam curados, hoje estão se curando através desse tipo de tratamento. Esse tratamento vai chegar em breve ao Brasil e o Grupo Oncoclínicas vai estar preparado para passar isso para os pacientes. Nós já temos médicos sendo treinados fora do Brasil para quando essa terapia estiver aprovada aqui no Brasil, nós possamos imediatamente oferecer a nossos pacientes. Nós temos que ter tecnologia, equipamentos, laboratórios e gente bem informada.
Os investimentos do Grupo podem ser alterados dependendo de quem vencer as eleições?
Nós estamos vivendo uma crise, mas nós acreditamos tanto no país, que continuamos investindo. Nós não estamos preocupados com o presidente, nós estamos preocupados com alguém que traga estabilidade. Nós estamos preocupados com alguém que traga estabilidade, estamos preocupados com alguém que traga segurança jurídica para que as coisas aconteçam, com alguém que permita que a prática médica seja feita, com alguém que invista na saúde. O que nós vivemos hoje é muito triste.
Toda essa tecnologia vai chegar aos pacientes do SUS?
Claro que vai, não tenho dúvida. Muitas dessas drogas, dos anticorpos que o paciente do SUS jamais pensou em utilizar, vão chegar a ele. Nossos serviços de radioterapia que atendem ao SUS, usam as mesmas máquinas que os pacientes privados, o mesmo médico, as mesmas máquinas, não tem discrepância. É óbvio que tem uma defasagem do SUS para o privado. Isso é um absurdo, mas isso acontece por falta de investimento na saúde. Nós vivemos anos e anos sem que as pessoas se preocupassem com a saúde. Mesmo assim, o setor privado continua investindo muito no Brasil.
Esse tipo de atitude que o prefeito de São Paulo, João Doria, tomou para acabar com as filas para exames é uma alternativa para garantir o atendimento à toda população?
É uma das. É o sistema público utilizando o sistema privado para atender. Não tem solução. O sistema privado de saúde faz parte da solução do sistema de atendimento ao paciente público, porque os hospitais públicos estão quebrados. Os hospitais filantrópicos, que na realidade não são públicos, a maioria dos pacientes do SUS são tratados nessas instituições. Nós temos que diagnosticar, nós temos que tratar e não cabe aos hospitais privados substituir o sistema público, mas pode ser parte da solução.