O caminho escolhido pelo governo brasileiro, de fazer mudanças pontuais sem atacar o real problema da economia brasileira, só aumenta as incertezas e a desconfianças dos investidores. A análise é do ex-presidente da Vale e da Usiminas e atualmente presidente da Vicenza Mineração, Wilson Brumer. Para ele, o endividamento do Brasil é outro fator preocupante, próximo de 70% do PIB. É um novelo de lã, segundo Brumer, que só vai crescendo. Colocar a culpa do cenário internacional também não está correto, porque outros países estão crescendo, inclusive a Argentina, que não mudou nada na economia, a não ser o seu comandante, pelo menos por enquanto.
As ações da presidente Dilma neste ano sinalizam mudanças significativas na economia?
Nós temos algumas situações na economia brasileira, que para enfrentá-las, não adianta tomar medidas pontuais. Continuamos no Brasil, a meu ver, sem um projeto. Estamos discutindo mudanças pontuais, como o aumento do imposto do chocolate, biscoito, ração de cachorro, enquanto não discutimos como vamos cobrir o déficit fiscal. Aí vem a CPMF. Mas se a CPMF vai ou não aumentar e criar um equilíbrio fiscal, ninguém sabe. A receita do governo só está caindo porque não está havendo investimentos. E por que não está havendo investimentos? Porque há uma desconfiança geral, não há credibilidade e o investidor, o empresário, não vai investir onde não existe, pelo menos, uma perspectiva de futuro. Aliado a isto, temos outra coisa que ninguém fala, que se chama déficit nominal, que inclui os juros que o governo tem que pagar. O endividamento do Brasil hoje, sob o ponto de vista de dívida bruta, está chegando a quase 70% do PIB. E é como se a vida inteira você pudesse rolar esta dívida. Isso é um novelo de lã, que só vai crescendo.
Esse fator aumenta a desconfiança do investidor?
Há uma desconfiança geral na condução da economia, há uma falta de liderança política e empresarial. Se não houver um fato novo no Brasil, que pode acontecer em 2018, com as novas eleições, este quadro não mudará. A Argentina, o que aconteceu ali em termos macroeconômicos? Nada. Houve uma mudança de presidente, com um discurso diferente, visão diferente e os títulos da Argentina hoje são negociados com menor risco do que o Brasil. Do ponto de vista macroeconômico, isso não faz o menor sentido. É a questão da credibilidade, da confiança. O governo não está conseguindo transmitir para a sociedade confiança e credibilidade. Assim fica difícil avançar. Não adianta um pacotinho aqui e um pacotinho ali.
O que falta ao governo, regras claras para os investidores?
Se não houver segurança jurídica, regras claras, não vamos atrair investimentos. Falta um projeto de país. O que nós temos hoje é um projeto de poder.
E no caso específico da mineração que está muito afetada pela crise?
Nós tivemos no ano passado uma queda do PIB entre 3,5 a 4%, os números ainda estão sendo fechados. A tendência é que 2016 vá pelo mesmo caminho. Nós vamos ter uma queda no PIB do ano passado muito acentuada e devemos seguir mais ou menos na mesma ordem neste ano.
O que pesa mais, o cenário internacional?
Não é só o cenário internacional. Normalmente se atribui ao cenário internacional os problemas da nossa crise. Mas isso é não querer ver que tem países que estão saindo da crise. Os Estados Unidos crescem aos níveis que todo mundo gostaria? Não. Mas estão crescendo. Espanha já saiu. A China não está crescendo no nível que todo mundo gostaria, mas continua crescendo mais de 6%. A Índia vai crescer mais de 7%. Na América do Sul a Colômbia está crescendo, o Peru e o Uruguai estão crescendo. O Paraguai está crescendo. Atribuir só à crise externa o que está acontecendo, é não olhar para os nossos problemas.
Tem empresário transferindo a produção para o Paraguai por considerar o ambiente mais favorável. Essa é uma tendência, a de procurar países que tem melhores condições do que o Brasil?
São casos pontuais. Não é esse o espírito geral do empresário brasileiro. Nós temos que trabalhar porque o Brasil hoje é muito pouco competitivo. São os velhos problemas: tributação excessiva, complexidade tributaria, falta de infraestrutura adequada, energia cara, qualificação e assim por diante. Os problemas estruturais do país não estão sendo atacados. Nós estamos aí, de novo, discutindo coisas pontuais. Vamos lançar um pacotinho aqui e o BNDES fazendo empréstimos. É essa a solução para o Brasil? Não, não é a solução.
Qual seria?
Ou nós partimos para um projeto de país, discutindo efetivamente as ações que têm que ser implementadas, ou nós vamos ficar aí discutindo novamente o aumento de imposto do chocolate e da ração para cachorro.
Pelas ações do governo, 2016 será também um ano difícil?
Deve ser um ano com uma inflação um pouco menor do que o ano passado, porque os ajustes dos preços públicos de energia elétrica, combustíveis foram muito fortes e impactaram muito a inflação. Pode ser que a inflação fique em torno dos 7%, que é menos ruim do que foi a do ano passado, mas mesmo assim é uma inflação alta. Entendo que estamos com a prática de uma taxa de juros que não vai reduzir a inflação, porque nós não temos hoje no Brasil uma inflação de demanda. Ninguém está comprando nada. Temos queda na indústria automotiva, até nos supermercados as quedas estão acontecendo. Se não tem inflação de demanda, o que temos hoje no Brasil é inflação de custo, que é o da logística, o que quer dizer, devido ao preço do combustível, da energia e assim por diante.