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União cada vez dá menos dinheiro para a saúde

Os recursos para a área de saúde estão cada vez mais escassos. Quem precisa de atendimento pelo SUS sabe bem o que isso significa. Essa foi uma das áreas mais atingidas com os cortes no orçamento da União, obrigando estados e municípios a investir o que o governo federal deixa de aplicar. Mas mesmo com todo esse esforço, está cada vez mais difícil manter a qualidade no atendimento. O Coordenador do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Defesa da Saúde em MG, e presidente da Associação Nacional de Defesa da Saúde, promotor Gilmar de Assis (foto), disse que o congelamento no orçamento proposto pelo presidente interino Michel Temer vai piorar ainda mais a situação. E avisa que, se a população não se mobilizar e entender que o Sistema Único de Saúde é um patrimônio, a tendência é a de deterioração do sistema e quem perde são os 202 milhões de brasileiros.

 

Qual é a radiografia da saúde no Brasil?

Por um bom tempo nós pensamos que o problema da saúde fosse de gestão. É fato que a gestão é também um dos componentes que precisa ser cada vez mais qualificado e aprimorado. Mas uma boa gestão sem recursos suficientes para fazer saúde de acordo com as necessidades coletivas de saúde, numa lógica de planejamento também é muito grave e está mais do que provado para nós, pelos números, pelos indicadores, que cada vez mais, diminui a participação da União, do governo federal, no financiamento da política pública da saúde. Os estados e municípios é que tem feito a cobertura dessas parcelas, principalmente os municípios, que teriam a responsabilidade de aplicação de 15% do orçamento. Mas em razão da contingencia dos recursos federais, os municípios estão aplicando uma média de 23 a 26% de tudo que se arrecada, na área de saúde. Houve uma diminuição da participação federal. Quando se resgata em 2003 a participação da União no financiamento das ações de saúde era de 62%. Hoje não representa 41%, ou 45%, está mais ou menos nesta faixa o volume de financiamento da União, sendo ela, a maior arrecadadora de tributos. Nós não conseguimos fazer ainda no Brasil, uma boa reforma tributária. Quem mais arrecada tributos no país é a União. Principalmente, os recursos que financiam a seguridade social, exclusividade da União, que são as contribuições, que fazem a seguridade social. Infelizmente isso não tem se traduzido em políticas públicas de saúde, na forma, não de um ideal, mas na forma real que a sociedade precisaria para atender o seu planejamento de saúde.

 

Hoje a população está refém dos planos de saúde?

Os planos de saúde, ou a saúde suplementar atua em um nicho suplementar. Nós elegemos a saúde em um plano universal, com integralidade e cobertura para todos os 202 milhões de brasileiros. É um direito fundamental. O que precisa fazer é termos o financiamento adequado, no patamar, se não maior, pelo menos igual aos países da América. O Brasil está no último lugar no ranking de financiamento público da saúde, entre os países da América. Quando comparamos com os países que têm um sistema semelhante ao do Brasil, de universalidade do acesso, como o Canadá, o Reino Unido, a Espanha, chega-se à conclusão que eles investem três, quatro, cinco vezes mais em termos per capita e do PIB, do que no Brasil. Infelizmente a saúde no Brasil continua desfinanciada, asfixiada por esses ataques de desvinculação de receitas da União de recursos da Seguridade Social, em razão dos restos a pagar que são colocados ou que passam de um orçamento para outro sem a garantia do pagamento. Além dos contingenciamentos sucessivos. Tivemos na Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2016 o veto presidencial cortando aquilo que o Congresso tinha reconhecido de bom e necessário, que era o aumento de recursos para atendimento de alta e média complexidade e para a farmácia popular. A sociedade não sabe desse detalhe. Não foi colocado para o planejamento ou o orçamento da União de 2016, nenhum centavo de recursos para o programa Farmácia Popular. A assistência farmacêutica, que é outro bloco de financiamento, também corre o risco de progressivo desfinanciamento.

 

A proposta do presidente interino Michel Temer, de congelar os recursos por 20 anos também seria um golpe?

Eu imagino que a intenção do governo, como sempre foi, é a de fazer caixa para que ele se torne superavitário para o pagamento de dívidas públicas, às custas de uma política pública ou de uma política social. A meu ver, o desenvolvimento econômico, que é necessário, que todos nós apostemos, todos nós torcemos, mas não se pode dissociar-se do desenvolvimento social. A política pública tem que acompanhar, junto, o desenvolvimento econômico. Se você distancia, faz essa separação, você acaba colapsando uma das áreas, no caso a área social, que precisa dessa mão de obra para produzir e ajudar no desenvolvimento econômico do país.

 

Qual seria o investimento necessário para se ter um atendimento adequado à população?

Hoje o Brasil investe com os recursos da União, estados e municípios juntos, cerca de 3,5 a 4% do PIB, quando na verdade os países desenvolvidos, ou os que adotam sistema semelhante aplicam 11, 14 e 17%. A proposta que a sociedade brasileira elegeu, e este movimento se iniciou em Minas Gerais, que é o Saúde mais 10, onde colhemos mais de dois milhões de assinaturas em todo Brasil. Foi o que nós definimos como parâmetro, 10% do PIB, o que infelizmente não aconteceu. O Saúde mais 10 começou na Assembleia Legislativa e atingiu todo o Brasil, que defendeu o investimento de 10% das receitas brutas para a saúde. Esse projeto, de iniciativa popular foi arquivado pelo Congresso, e no lugar dele, colocaram a PEC 86, que ao invés de melhorar, piorou a situação, retirando expressivos recursos, os 25% dos royalties do petróleo para a saúde, instituindo as emendas parlamentares não como um acréscimo, mas tirando os recursos finitos da saúde. E agora, a proposta PEC 241, de revogar a PEC 86 e piorar o cenário, congelando por 20 anos o orçamento que aí está, corrigindo apenas pela inflação.

 

Não adianta só apresentar o projeto de iniciativa popular, é preciso acompanhar e pressionar os parlamentares?

Tem que pressionar. A sociedade precisa empoderar e perceber que o SUS, que é um patrimônio, é dela. A sociedade costuma defender a saúde, quando dela precisa. Mas se a sociedade entender que ela é também um potencial usuário desse Sistema Único de Saúde, ela deveria se apoderar disso e realmente fazer a defesa necessária. Infelizmente, se nós não nos mobilizarmos, essa PEC 241 deverá ser aprovada.

 

Qual seria o modelo ideal de saúde?

Continuo achando que é o da saúde pública universal e integral, com garantia na cobertura das ações do serviço público de saúde, porém, de uma forma adequadamente financiada, com uma gestão qualificada e que precisa de uma grande mobilização positiva para rediscutir com a sociedade alguns temas que ainda ficaram pendentes de discussão para melhorar essa saúde pública.

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