Desde julho do ano passado a AngloGold Ashanti passa por uma transformação, sob o comando de Marcelo Pereira (foto/reprodução internet). Profundo conhecedor do setor mineral, ele chegou em um momento difícil para a empresa, com o objetivo de imprimir uma gestão mais enxuta e eficiente. A AngloGold completa neste ano, 190 anos de atividade, e se orgulha de ser a empresa mais antiga em atividade no Brasil.
Qual o balanço da AngloGold Ashanti em 2023, com os problemas que envolvem o setor?
Tenho que destacar que 2023 foi um ano bastante desafiador para nós da AngloGoldo Ashanti, porque foi um ano de algumas transformações importantes dentro do nosso negócio. Foi um ano que nós tivemos diversas mudanças, tanto na filosofia operacional, quanto na nossa estrutura organizacional de uma forma geral, a partir da minha chegada, inclusive. Começou com a minha chegada com algumas mudanças importantes que nós fizemos ao longo do ano. Vínhamos de um primeiro semestre com bastante desafio no cumprimento dos nossos objetivos e, felizmente, conseguimos de uma forma bastante responsável, organizada e a partir da participação de todos, conseguimos reverter o primeiro semestre bastante complexo. Nós tivemos uma paralisação de uma das nossas operações de Queiroz. Nós tivemos também uma decisão – eu já fazia parte da nossa AngloGold Ashanti- com a paralisação de uma operação chamada Córrego do Sítio. Algumas decisões difíceis, que precisavam ser tomadas na garantia da preservação da solidez e da continuidade dos outros negócios que nós temos no grupo e, de uma forma geral, no segundo semestre, nós conseguimos trabalhar de forma bastante austera, organizada e conseguimos reverter parte dos impactos negativos que tivemos no primeiro semestre, fechando o ano, ao meu ver, de forma bastante positiva, principalmente no sentido da segurança das pessoas, de algumas políticas nacionais, nas questões de atendimento ambientais, cumprimento de requisitos legais, assim como também na sustentabilidade dos nossos resultados.
A legislação ambiental é um fator que preocupa?
Não, ela não é um fator que nos preocupa sob o ponto de vista do seu cumprimento, inclusive, entendemos que as legislações são definidas e buscam o mesmo objetivo que é o de melhorar continuamente o nosso atendimento das comunidades, onde nós operamos e o melhor, servir de uma forma geral as pessoas, as comunidades. Um ponto que a gente sempre tem como destaque é que nós somos uma empresa que, neste ano de 2024, nós completaremos 190 anos. Fomos a empresa mais longeva desse país e com o seu nascimento em 1834, diversos dos nossos processos que tínhamos 30 anos atrás, há 20 anos atrás, atendiam a todas as legislações. Hoje eles podem não atender. Então isso exige de nós a capacidade realmente de forma verdadeira e genuína, transformar o nosso negócio para que a gente atenda as legislações de forma mais ágil possível. Ou seja, célere e, também, com eficiência. Na antiga, não tem nenhum descumprimento de requisito legal por causa dos nossos negócios.
Essas mudanças climáticas têm impacto na atuação da empresa?
Absolutamente. Assim como muitos outros meios, o nosso negócio, também, sofre severos impactos dessas mudanças climáticas. Uma delas eu posso te dizer é na intensidade das chuvas, que assolam os nos nossos negócios, o que exige de nós ainda mais capacidade de trabalhar, planos preventivos de drenagens, planos de preparação para o período chuvoso, planos de atendimento naquilo, que por exemplo, quando eu disse que antigamente atendia muito bem as legislações ou a segurança das estruturas, com chuvas que temos hoje de 120 mm, 137 mm, em um período muito curto, sem sombra de dúvida, a capacidade dos nossos sistemas devem ser reavaliadas. Nós temos feito isso de forma bastante intensa, temos que ser diligentes em garantir que a gente possa fazer o atendimento, Inclusive, em alguns casos, excedendo o que diria as legislações aplicáveis para garantir que a gente não impacte, mais uma vez, as comunidades em que atuamos, a flora e a fauna que nos cerca.
O faturamento da empresa em 2023. Como que foi?
Mesmo com os impactos oriundos de uma menor produção em algumas das operações, como por exemplo, CDS, o Córrego do Sítio, que nós paralisamos, era um importante ativo de longa data na nossa operação. Ainda assim, com a performance que nós tivemos, alguns impactos também, em Serra Grande, a paralisação da operação de Queiroz, ainda assim, nós conseguimos ter um resultado bastante satisfatório e dentro de nossos limites e projeções que haviam sido definidas, revertendo alguns resultados negativos do primeiro semestre, inclusive, eu posso antecipar que eu estou bastante contente com a performance da companhia e a transformação que estamos fazendo, mesmo em um curto espaço de tempo, a partir da capacidade que as pessoas têm de transformar e a capacidade que nós temos tido de colaborar entre áreas, para construirmos uma empresa melhor. Nesse sentido, estou bastante contente com os resultados que tivemos no segundo semestre, o que tem ajudado a reverter um pouco os resultados negativos do primeiro semestre.
Em termos de investimentos, a AngloGold tem investido alto. Vai continuar no mesmo ritmo?
Temos mantido um investimento bastante considerável nas nossas operações. O número de investimento em 2023 foi em torno de R$ 1 bilhão. A nossa expectativa é de que nesse novo orçamento, a ser a finalizado ainda esse mês, seja mantido aproximadamente esses limites de investimento, uma vez que nós temos investimentos, principalmente voltados ao reforço e descaracterização de algumas das nossas estruturas geotécnicas, assim como o ganho de competitividade, que também é uma área de investimentos que estamos focando bastante para que a gente continue mantendo a saúde financeira dos nossos negócios, a competitividade dos nossos negócios, apesar de ter as minas mais profundas do país e apesar de alguns impactos que temos, também, pela pelas nossas operações.
O efeito China tem prejudicado o desempenho da AngloGold?
Não diretamente. Felizmente, o nosso negócio não sofre impactos tão fortes como empresas que trabalham com minério de ferro, por exemplo, e siderúrgicas. O nosso negócio sofre um pouco diferente esses impactos. Como por exemplo, quando a gente tem um impacto de menor demanda na China, tem, consequentemente, em alguns casos, o aumento do dólar, o que faz com que o nosso produto fique mais caro no mercado externo, para quem compra. Mas, ao mesmo tempo nos ajuda. Nós temos um valor de ouro, que é a nossa unidade de medida, que é mais competitivo, mais alto. Em 2023, chegamos a atingir números de US$ 2.0 27 ou US$ 2028 por onça. O que é bastante positivo para o nosso negócio. De forma geral, inclusive a expectativa que temos que 2024 é que ele continue forte e os investidores continuem procurando ouro como uma forma de investimento ainda em 2024.
Com as complicações da política no Brasil e América Latina o ouro acaba sendo um investimento mais seguro/
Eu entendo que sim. Acredito que o Brasil deve continuar preservando políticas e, principalmente legislações, que continue mantendo a integridade e, principalmente, a confiabilidade dos investidores no nosso país, da mesma forma que precisamos ter bastante atenção, principalmente, com a questão relacionada aos nossos tributos, para o nosso negócio, por exemplo, o ouro, nós temos uma das mais altas cargas tributárias do país. Do país não, do mundo, entre os produtores a mundiais de ouro, a nossa taxa tributária é de 21%. Nos preocupa quando falamos ainda de política, como a gente está tendo, por exemplo, a votação neste momento e as leis que estão sendo elaboradas, como a de 1% de imposto seletivo, o que impactaria ainda mais e pode onerar ainda mais as nossas operações. Nós já temos impactos realmente significativos quando falamos das taxas de royalties. Esse é um ponto sim de atenção e entendo sim, que o ouro continua sendo uma moeda segura, principalmente para os investidores, em momentos como da guerra entre Rússia e Ucrânia, os movimentos na Palestina, entre Hamas e Israel, entre outros, que trazem inseguranças não só jurídicas, mas também de mercados para os investidores. Diferente de outras commodities, o ouro possa ter um resultado mais positivo.
No início do governo Lula, havia muita expectativa no setor mineral em relação ao ministro Alexandre Silveira? Como que o setor tem negociado com ele essas questões?
Nosso relacionamento, felizmente, tem tido bastante positivo. Nós temos tido todos as nossas falas ouvidas em todas as instâncias do governo e temos mantido um excelente clima, tanto de negociação, quanto de contribuição em ambos os lados. Temos feito interlocução muito forte a partir do Ibram, que é um instituto que nos representa de forma bastante austera, bastante precisa, até porque não é uma abordagem apenas da Anglogold, ela deve ser uma abordagem mais coletiva, envolvendo outras instituições no país. Nós respeitamos todas as decisões que são tomadas e, claro, nos posicionamos sempre de forma a olhar para a competitividade do nosso negócio, continuidade das nossas operações e da melhor forma contribuir para o nosso país.
Por esse ser um ano político, algumas pautas do setor podem ficar comprometidas?
Felizmente, a interlocução e os trabalhos que a gente tem feito junto com ao Ibram na interlocução muito positiva junto ao governo. Entendo que mesmo sendo um político, uma vez que a gente não tem mudanças, principalmente a nível presidencial, entendo que não atrapalha, não prejudique as nossas pautas. Entendo que continuamos tendo, sim, a oportunidade de discutir e de ser buscar o melhor caminho, o consenso de negociação e de discussão junto a todos os outros interlocutores.
Para 2024, quais são as prioridades da AngloGold?
A primeira prioridade que eu posso é lhe dizer é que vamos trabalhar da melhor possível para garantir a segurança das pessoas, assim como da lei do atendimento às legislações que são aplicadas aos nossos negócios, e nisso inclui-se uma prioridade bastante forte, a qual temos trabalhado e investindo recursos importantes, que é na segurança das nossas estruturas geotécnicas, seja por descaracterização delas, aquelas das quais nós já temos o plano de descaracterização quanto naquelas que nós temos planos de seguir operando para garantir um melhor nível de conhecimento, monitoramento e gestão das nossas estruturas, aferindo a elas o melhor nível de segurança a essas comunidades que tem algum tipo de impacto ou que estão próximas nossas estruturas.
A sua história é inspiradora. Como tudo começou até chegar à presidência da AngloGold?
Acho que minha história se assemelha com a história de muitos de nós brasileiros. Venho de família humilde, não com tantas oportunidades de estudo, ao mesmo tempo, que eu comecei a minha vida na mineração, eu tinha que me dedicar ao estudo. Em 1998, ou seja, há 26 anos quando eu comecei, passei por posições de entrada. Eu fui vigilante de uma empresa de mineração no interior de Minas, mais precisamente em Paracatu. A partir daí consegui uma oportunidade dentro da companhia, na Votorantim Metais, hoje Nexa, a qual eu tenho muito orgulho, porque lá aprendi muito. Como auxiliar de produção, já lavei muito piso de usina, na João Pereira. Passei por toda a cadeia de processos, por toda a cadeia produtiva em uma empresa de mineração e aprendi, que não tem ninguém que seja diferente do outro. Hoje eu estou nessa posição, agradecido a Deus pela oportunidade, mas sabedor que eu tenho que cuidar da mesma forma que outras pessoas devem ser cuidadas e que todos nós temos importância dentro desse negócio. Tive a grata oportunidade de conhecer boas pessoas, que me ajudaram ao longo do caminho. A partir dali, dessa primeira oportunidade de mineração na empresa, como eu disse na Votorantim metais, eu passei por outras empresas, como a mineração Caraíba, passei pela que Kinross passei pela mineração da Taboca, chegando como última passagem de trabalho na Vale, aonde eu fui responsável pelo complexo Paraopeba, como diretor responsável por esse complexo até a chegada aqui na AngloGold Ashanti, em julho do último ano. Estou muito contente, primeiro pela oportunidade de ter passado por diversos negócios. Tive o prazer de conhecer diferentes culturas, diferentes desafios. Aprendi a trabalhar com nióbio, com estanho, níquel, zinco, chumbo, cobre, calcário, entre outros produtos. Nesse caminho, fui criando e tendo a oportunidade de enxergar diferentes formas de ajudar as empresas, a qual faço parte e estou muito feliz de estar aqui, de poder ajudar de alguma forma e começar a ver alguns sinais de transformação da nossa empresa. Estou muito contente, inclusive com a oportunidade que nós temos de fazer ainda mais. Isso foi o que me orgulha. Isso é o que eu espero, inclusive, deixar de algum tempo, um legado de um trabalho legal e, principalmente, responsável seja para a companhia e com a sua comunidade.